quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Teoria da espuma


Uma parte dos seres humanos, que cresce a cada dia (feliz ou infelizmente é uma questão mais estética do que outra coisa), está permanente conectada. Aparelhos que há dez anos serviam ou mal serviam pra falar, hoje guardam pedaços de biografias inteiras. O que esses humanos vêem ou falam ou escrevem viajam em segundos por entre os pontos do globo como numa rede de neon, rápida, densa, pulsante...

Quem diz imagens e textos e vozes transitando permanentemente de um lado pro outro diz emoções e idéias. Idéias que antes fermentavam e cresciam pra virarem alguma coisa no fim, hoje assim que surgem se lançam no universo conectado de todos e... estouram, como nada. É como um grito numa manada de animais, como uma reação em cadeia que só a bomba atômica ilustraria de maneira suficiente...

O dito sem sentido que numa sala de amigos se desfaria em segundos, agora perdura por dias e talvez semanas em mundos cuja existência é tão sutil quanto a corrente elétrica: uma bolha de sabão refletida num espelho infinito até o enjôo... Bolhas de frases, de palavras, de emoções que se reproduzem como vírus – criando uma doença em minutos... e em minutos se desfazendo e nonsense.

Uma semana atrás equivale há dez anos de atraso se comparados ao esquema temporal de há meio século. O que se disse ontem pode parecer tão antiquado quanto o que se ouviu na década passada.

O vestido dela de ontem – bolha. A frase no topo de ontem: bolha. O vídeo de sábado: bolha. A piada do dia: bolha.

É como se disséssemos espuma, ouvíssemos espuma, pensássemos espuma: idéias, emoções, falas leves e passageiras ao extremo, renováveis indefinidamente. Não com uma onda no mar – esta tem uma estrutura que se repete e dura, nem que seja pouco, mas plástica, é identificável. A minha teoria é que a nossa linguagem hoje é de espuma – como a espuma do mar (falamos como nunca falamos antes, mas dizemos tão pouco como nunca conseguimos antes) É pura superfície e puro não-ser, puro quase-nada. Desmancha nas mãos se vc tentar pegar, não fica na memória, porque não é...


É fugidio e fugaz e fraco... intangível.

Os princípios da teoria da espuma são:

  • Sou um agora e outro amanhã; qualquer um talvez e vários provavelmente sempre;
  • O que digo não tem valor se não for ouvido por mais de dez pessoas ao mesmo tempo, nem que seja por vinte ouvidos surdos;
  • A imagem de bytes não marca – é um mero rastro de um momento evanescente e que muitas vezes... não tem importância;
  • Me olho na tela do computador como num espelho pra ter certeza de que existo;
  • No fundo eu sei que sou espuma nesse mar sem sentido – mas essa idéia também é bolha e...
  • ...já estourou.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Peripécias poéticas

Tô cansando um pouco de escrever coisa culta
Raxar o quengo pra dizer o que penso
Quando na verdade o que toda hora me cutuca
É aquilo que todo dia me deixa tenso.
Começa pelo calor, pela luz, pelo barui
Passa pelos tiros, o dinheiro e o assalto.
Termina nos projetos – me digo: “te alui,
Se quiser ser, subir e falar mais alto”...
Fugir do orkut, e da bruteza do Dr. House,
Lavar a louça e arrumar a minha house;
Calcular passos, projetos, listas e contas
E dormir meia-noite já com a cabeça tonta...
Sonhar com o paraíso, com o inferno, o império asteca...
Defender lindo a minha tese... estando só de cueca!
Acordar do pesadelo, dizer bonjour, comment vas-tu?
De vez em quando ter um intrigante déjà vu.
Beber mais água, comer mais frutas e verduras
Meditar um pouco, ir a facul, e à noite mais verdura...
Depois vêm do nada estranhas entidades
Calçando 44 ou dizendo yayê
Pessoas com quem pratico a difícil faculdade
De me divertir com mil coisas pra fazer.
Pois é tudo isso e muito mais:
Sou parente distante da Macabéa
Tenho um gato chamado Satanás
E uma bromélia seca morta réa...
Hoje é feriado, amanhã trabalho até a morte
Até de noite, só é Borges e infância,
Apresentação, metodologia... muita ânsia...
Então pra terminar, me desejo boa sorte.