sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

عاشت الثورة بوك!


Uma andorinha não faz verão. Mas dê um computador ou um celular conectado à internet que vc vai ver que as andorinhas que sozinhas não faziam nada mesmo, darem um show que seria digno do Cirque du Soleil.

Eu adoro nossos tempos de conexão. Tendo vivido até o fim da minha adolescência praticamente sem internet, lembro muito bem do mundo lento e ineficaz do mero telefone, das correspondências de papel e do mutismo de dias e semanas entre amigos e inimigos... Non, merci beaucoup, prefiro a rapidez meio mórbida de hoje. De freiras espanholas expulsas de conventos até revolucionários que expulsam ditadores, todos saem em geral, ganhando - e quem não reconhece isso é porque fecha os olhos diante de um produto comprado com urgência pela internet, ou da fruta exótica, ou da tragédia grega evitada por um sms ou email...


Fala-se em conexão e a palavra feissibuque vem à mente, não necessariamente com essa grafia. The Facebook, nome original da rede antes da intervenção de Justin Timberlake, está na moda, nos jornais, nos corações, nos pesadelos dos ditadores (dos autodeclarados e dos "bonzinhos"...). Os americanos, como sempre, quando inventam algo acham que ninguém nunca tinha pensado naquilo antes e agem dessa forma esquizofrência até que conseguem convencer a todos: foi assim com o avião e foi assim com as redes sociais - que a Globo chamava pedantemente, até pouco tempo, de "site de relacionamento". Para nós brasileiros esse formato de rede que convida vc a se expor e acompanhar a vida dos outros de forma descarada é bem antigo - remonta a 2004. O orkut abriu portas - acelerou o estabelecimento de contatos, turbinou amizades e inimizades, criou um mundo paralelo que complementava e catalizava a realidade. O feissibuque veio bombar há pouco mais de três anos e voilà, os americanos é que fazem a revolução... suponhamos que sim...

E falando em revolução, Tunísia, Egito, Bahrein, Líbia e cia entenderam o scrap; e eu falo do povo, obviamente: "não te vi hoje porque a polícia me olhou torto na rua, mas vê o teu orkut, aliás, feissibuque mais tarde". As redes sociais turbinam as revoluções, que sem o brinquedinho do Zuckerberg aconteceriam de forma tão lenta que nem chegariam a eclodir em forma de mudanças reais. Viva la revolución! De fato, podando os excessos dos discursos exagerados que repetem democracia e liberdade umas dez vezes num texto só, é óbvio que as redes sociais servem mais do que pra postar a foto da festa do dia anterior: compartilhamento de ideias e ideais, de planos de liberdade, de liberação, de ação. Pessoas como Mubarak e Kaddafi caindo com a ajuda de mecanismos de interação social virtual que até pouco tempo eram vistos como perda de tempo de adolescentes vagabundos: ver isso me faz bem. O futuro é a conexão. Conexão total... mas falo disso depois.


Ainda sobre revoluções. É claro que a história não é tão bonitinha assim. Governos ditatoriais caindo, a flor da democracia brotando de um solo viril e corajoso composto da honra e da índole pacífica mas lutadora de um povo oprimido é uma coisa linda de longe. Mas uma câmera de 15 megapixels mostraria as espinhas na cara do rapaz guerreiro proveniente talvez de uma bela coca-cola e de muito chocolate suíço... Uma máquina que lesse pensamentos talvez nos revelasse a palavra "petróleo" enquanto que as bocas tão bem articuladas de Obama ou de Sarkozy (ou não, no caso de Monsieur) soltassem diante das câmeras "democracia" e "liberdade"...

E convém ainda dizer que os governos ditatoriais que caíram, caíram porque não dispõem de uma indústria de mentiras publicitárias tão desenvolvida como a nossa, do Ocidente - seja lá o que esse termo sócio-filosófico-literário queira dizer exatamente. Feissibuque e cia minaram as bases das mentirinhas e turbinaram a capacidade de seus povos de se dizerem a verdade e suas vontades. Quem disse que o mesmo mais cedo ou mais tarde não vai acontecer por aqui? Os governantes russos já começam a tremer nas bases. China nem se fala. Nas Américas há quem sinta calafrios, e não é só Chavez, com certeza.


Mesmo que ao chegar aqui a onda de revoluções feissibúquicas venha parecer mais um tipo de movimento neo-hippie digital, alguma coisa vai acontecer. Não sei bem o quê, mas vai. E alguém vai pagar o pato... a internet não vai ser tão livre como é hoje dentro de poucos anos. E vão nos convencer a ter apenas uma conta de email, e uma identidade digital única, e a abandonar coisas como orkut e youtube, com propagandas fazendo menção a terroristas e vírus... isso é uma suposição intuitiva. Se fala mesmo por aí que esse oba-oba do "digo o que quiser" vai acabar. Vai ficar a cargo dos propagandistas do cinema, da televisão e dos governos nos convencerem que isso é uma coisa boa sob as ordens de Obama ou Dilma, mas não sob Mubarak e Kaddafi ou Chávez...

Ai, ai, adoro a nossa liberdade libérrima do Ocidente igualitário e justo! 



domingo, 20 de fevereiro de 2011

Hey girl, hey boy

Uma mesa na penumbra a céu aberto, pessoas desconhecidas mas simpáticas e certas quantidades de CH3 CH2OH em suas diferentes variedades, podem ser a base da origem de agradáveis sensações e interações que resultem em sorrisos, leveza e bem-estar... 

Ou não.

A batida e o perfume e o ritmo quase coincidindo com o do beat do coração e a melodia repetida casando em hipnose com os pensamentos, e a noite cortada ao meio pelo laser que também dança, podem ser sinfonia cacofônica pra comemorar o mero fato de existir e saber disso gostando.

Ou não...

O sábado, sobretudo em seu fim, pode ser um dia, uma era, um mundo e um ato de ser. Integrar um grupo que flui na noite ao som de risos e corpos e vontades - sem que as horas pesem - pode ser minutos de eternidade que bastam por instantes semi-completos. 

Or not!

Domingo nublado deveria ser o dia do descanso de quem criou um mundo de caos em uma noite para restituir-se o de ordem na segunda, com prazer. E parece que não é...

Será que essas palavras são um modo meio longo de se dizer "bem-feito!" a respeito do resultado emocional indesejado causado pela reincidência de interações não-produtivas e suas consequências desagradáveis?


domingo, 13 de fevereiro de 2011

Cisne Negro


Torna-te aquilo que és.

Ontem vi o Cisne Negro e a cara da Nathalie Portman, que passa do doce amável encantador para o trágico coitado desalentador em questão de microssegundos me sugou um pouco as forças. Mas no fim mas devolveu (desculpem pela contração antiquada...) em forma de alguma coisa que não era exatamente boa... mas produtiva.

"Nina é todos nós" é muito clichê, então começo com o seguinte: é plenamente aceitável e até desejável em nossa sociedade atual que queiramos nos tornar mais do que podemos espontaneamente ser. O trabalho, a família, a academia, etc, exige isso de nós - o que vai ser bom ou ruim de acordo com o contexto - tudo é bom ou ruim de acordo com o contexto na verdade. (a redescoberta do óbvio é o meu TOC).

No entanto, o Caminho das Coisas, a Vida, o Destino ou o C*r*l** de asa (tudo isso são sinônimos) em geral nos dirige a algum ponto que sob a maioria das análises seria considerado inevitável. Por exemplo, eu não poderia ser padeiro - se o fosse as pessoas comeriam pão sem muito gosto; não poderia ser padre, as pessoas sairiam da Igreja desconfiadas do azul do céu, ... enfim. Parece que existe para cada ser humano uma zona sombria, mais ou menos inatingível, que é sensato não procurar descobrir o que é - mesmo que a própria vida de vez em quando o sugira tacitamente...

O poder de uma mãe controlodora não pode nunca ser subestimado. Os sussurros ofídicos de certos amigos devem encontrar seu caminho de saída do outro lado dos canais auditivos... Não utilize moedas escusas na compra dos sonhos... Conselhos e avisos que você só falta gritar para a Nina durante o filme todo - mas como ela poderia ouvi-los cercada por aquela muralha de ursos e bichos de pelúcia, vigiada pela mãe enquanto dorme, sufocada por ela a ponto de se coçar até se ferir...?

Nos contos de Borges não existem vítimas nem culpados. As histórias são contadas de forma a se ter a impressão de que as coisas simplesmente se realizam e acontecem. Aceitar isso exige um sangue-frio - na verdade exige uma boa dose de sangue quente e frio que nos faça capazes de viver sem chorar nem rir demais diante das coisas, dos acontecimentos da vida. A história de Nina é uma história de inevitabilidade. E de muitas outras coisas: do lado negro e sujo da arte; da confusão que a hipertrofia dos desejos pode causar; de como a insensibilidade pode cegar as pessoas; de como querer ser o que não é pode às vezes destruir alguém.

As cenas são fortes, o entrejogo de emoções arrebata vc do começo ao fim e a perfeição desse processo tem um certo custo em bem-estar ao espectador no fim do espetáculo.

Torna-te quem és é a frase de efeito adolescente e pós-adolescente mais grave e séria da existência de um ser humano. Nina tinha nascido para ser o Cisne Branco - mas como ela poderia ter certeza disso sem ter tentado ser o Negro? 

Inevitavelmente Nietzsche custa caro para algumas pessoas.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Desconexões


Lendo sobre golfinhos ontem, soube que a reprodução em cativeiro desses animais inteligentíssimos e simpáticos é muito rara, e que a única maneira de se conseguir um golfinho (pros shows à la Flipper, ou pesquisas e estudos cientificos) é "pescando-os", ou seja, extraindo um coitado golfinho do seu ambiente natural - o que aparentemente não é um grande problema, já que eles são das poucas espécies que em inúmeras ocasiões decidem espontaneamente viver entre humanos - cita-se casos até de golfinhos embaixadores, que de vez em quando, e regularmente, deixam seu grupo de congêneres para se aproximar dos macacos inteligentes que adoram brincar na água.

Mas também vi que muitos morrem ao serem aprisionados nos tanques humanos. O que de fato não é próprio apenas dos golfinhos. Praticamente todo ser vivo que quando extraído do convívio social ou familiar no qual se desenvolveu passa por crises que começam a nível fisiológico mesmo e atingem os níveis psicológicos e etc - e vice-versa - culminando não raras vezes com a morte... Seres humanos também são assim.

Ser um ser humano não é uma coisa simples. Não que eu diga que fugir de tubarões e de pescadores idiotas seja fácil, mas estar inserido numa rede tão grande e tão bagunçada (organizadamente caótica: paradoxo básico) de pessoas, coisas e animais, muitas vezes satura, enche o saco. No presente caso melancólico que introduzi com essa história de golfinhos, trata-se de... saudades.

No estado de disponibilidade para conexões que experimento nesse momento, entendo mais do que nunca as ideias metafísicas de conexão sobrenatural que vários povos antigos e pessoas idiotas atuais supõem existir entre seres humanos que compartilham longos trechos de genoma em comum. Mãe, pai, irmãos e irmãs, etc, parecem mesmo fazer parte de um tipo de ser meta-humano, um meta-indivíduo que se apresenta multi-partido em várias versões variáveis... Quero dizer que família é família. Há alguma coisa no sangue que fala alto e grita de vez em quando... E a desconexão às vezes causa instabilidade no sistema.


Eu olho pro mar e mixando meus conhecimentos de biologia (que adoro) com poesia e cibernética, não consigo parar de pensar na primeira "coisa" viva que deve ter ousado sair do mar, e ainda na primeira célula que nadou nas águas antiquíssimas. Que mar em francês seja uma palavra feminina e tenha a mesma pronúncia de "mãe" basta pra me fazer reverenciar "la Mer" e "la Mère" como uma coisa só e magnânima. Juntem a uma paisagem nebulosa de vermelho ou de azul profundo útero, calor, lembrança, e teremos os elementos de um poema melancólico e nostálgico que é melhor eu não ousar escrever.

Impossível não lembrar quase toda hora que sou em grande parte... mar - em francês.


sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Das conexões

Há dias que tava querendo escrever um post com esse título, Das Conexões. Eu gosto muito de títulos. Títulos na verdade funcionam como chaves de interpretação muitas vezes. Mas também quantas outras idiotamente se deixa de ter grandes prazeres e descobertas por causa de títulos mal interpretados ou pré-julgados: Misto-quente, por exemplo, do Bukowsky, é perfeito, nojetamente perfeito, e levei meses pra me dignar a tocá-lo. "Jorge Luis Borges, o escritor argentino", por exemplo, é outro título, cuja segunda parte, "o argentino", me impediu de lê-lo durante anos... pra no final descobrir nele pedaços inteiros da minha alma... enfim.

Das Conexões eu gosto porque "das" é o intrigante artigo definido neutro em alemão (um dia vou falar alemão, je jure), e "conexões", com o seu X com som de ks tem uma sonoridade ótima. Além do que, mais do que a etiqueta, o conteúdo que se supõe vir disso parece ser interessante, ainda mais na nossa época, a época das conexões.

Mas que conexões? 

A primeira em que eu penso é a anterior a todas (eu gosto de drama mesmo, de profondeur): aquela que se estabelece numa arquitetura semi-mágica, feita de água, carbono, hidrogênio... é o quê? Aquela que se realiza silenciosamente e de maneira tão natural que chega a dar arrepios: a da mãe e do filho no útero. Na verdade, se se pensa bem, é uma conexão que surge de uma separação vital: onde havia um ser humano e um conjunto de elementos quentes e vermelhos e escuros surge simplesmente um outro ser que pode vir a ser um ser humano: isso é a coisa mais parecida com mágica que existe. Pois bem, essa é a primeira conexão, aquela sem a qual nenhum ser humano até agora pôde passar a existir.

Em seguida uma série de outras ligações e junções também passam a se realizar: entre as células do corpo, e sobretudo entre os neurônios... e com os pais, e com os irmãos. Atualmente, na nossa sociedade meio fútil e sem destino, as crianças começam a se conectar virtualmente aos três, quatro anos (faço estimativas). E a partir dessa estreia virtual, um mundo de coisas acontece.

(...)

Um homem não é uma ilha. Não, acho que ele é mais é um planeta, com toda a sua geografia e suas camadas e as civilizações que o habitam, o modificam e o embelezam ou destroem. Alguns planetas desses se tocam, outros se esbarram, outros dançam ao redor de uma estrela comum por muito tempo ou pra sempre, ou até que a estrela morra de tanto brilhar... Uns são gigantes gasosos e outros são rochas frias ou quentes demais. Uns abrigam uma vida abundante enquanto outros eliminam qualquer possibilidade disso...

Adoro metáforas... mas seres humanos não são planetas também. São animais. E animais querem coisas segundo seu modo de funcionar. Animais querem viver. Na nossa espécie se conectar aos outros é vital para isso. O que não impede no entanto de desenvolvermos várias disfunções no processo de conexão. Alguns por gostarem mais de fazer downloads do que uploads se veem meio insatisfeitos; enquanto outros de tanto upload que fazem se pegam vazios de conteúdo e... metáforas!

Seres humanos não são poços também. Nem caixas, nem computadores, nem coisas. As conexões que estabelecem entre si são tão variadas e complexas que ousar propor uma Teoria Geral das Conexões Humanas é uma das maiores pretensões, e mais inúteis, que se pode ter. Eu queria que se pudesse. Mas como não penso que seja, suponho coisas. Algumas dessas coisas são (retomando metáforas):

- Até hoje não se observou planetas que tenham surgido sozinhos - sempre fizeram parte de uma estrela e sempre compartilham conjuntos de órbitas com outros;

- Computadores solitários (offline) são máquinas de escrever com tela;

- Poços são espaços que nunca estão completamente vazios (aranhas, vermes e outros seres sempres estão presentes, senão, há toujours as bactérias e os fungos microscópicos);

Finalmente, pra terminar essa reflexão meio cifrada (e um tanto desconexa), fazendo um pot-pourri dos elementos metafóricos anteriores: dois poços de solidão conectados pela internet não são tão fundos assim... tudo é questão da qualidade de conexão.

Connected forever.