quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Harlem Shake e excrementos

Formigas, bactérias, vermes, vírus... Cada vez mais essas metáforas biológicas parecem ter mais a ver com o que se assiste neste nosso mundo dos deuses todos e nenhuns.

Comparar homens e formigas sempre é muito pedagógico: quantidade, trabalho, organização coletiva (ok, eu sou otimista), insignificância individual de ambos os grupos colam bem. A comparação com bactérias, vermes e vírus é uma coisa meio Augusto dos Anjos e em geral, nos dias de hoje, tem tom ético ecológico, mas serve também, principalmente aos mais realistas (my opinion).

Claro que é bom deixar assente que em tais comparações fica implícita uma ofensa essencial contra os seres em questão, e não estou falando dos seres humanos...

Mas, enfim, a que comparar espécimes de Homo Sapiens sapiens que, de modo tão espontâneo, diligente e patético (patético não é necessariamente antônimo de engraçado ou divertido), se entregam à imitação pura e simples de comportamentos que, sob as mais diferentes perspectivas, não querem dizer inexatamente nada mais que um “pule de um pé só” ou “cabeça pro lado, corpinho pro outro”? Efeito manada? Efeito não-tenho-o-que-fazer?

Diretamente ao ponto, estou falando dessa coisa viral chamada Harlem Shake. O resumo não é muito longo nem complexo: grupo de amigos anônimos se remexe – como se dançassem – ao som de um dance Techno de qualidade moderada; de uma não-coreografia que faz alusões ao ato sexual, passam, com a mudança no ritmo do dance, a um remelexo parecido com um ataque epilético ou crise de diarreia, ou as duas coisas juntas. Ponto. Por motivos que nem os doutos mais doutos afirmariam serem os definitivos e exatíssimos, esta cena de pouco mais de 30 segundos, postada no youtube, virou febre entre milhões de outros Homo Sapiens sapiens.

A pergunta é: WHAT THE HELL?

Uma resposta possível é: les neurones miroirs, ou, menos francófilo, neurônios espelho. Uma lida sobre o assunto, que meus não-numerosos leitores farão em outro lugar, revelará que os neurônios espelho são objeto de pesquisas recentes no campo de neurociência e de que se diz estarem na base de comportamentos de imitação e de aprendizagem. Ela dança, eu danço; ele sorri, eu sorrio também, ele chora, eu choro, ele boceja, eu bocejo. É como se num nível inconsciente, fisiológico, o aparato neural e muscular que somos estivesse predisposto a imitar o que vemos de uma maneira muito mais que incontrolável. É bom lembrar que se não fosse essa capacidade “inata” de imitação, não seríamos capazes de aprender, e portanto, de sermos seres humanos, ou projetos disso. Os neurônios-espelho não se encontram apenas na nossa espécie, claro.

Cientifices à parte, muito bem: Harlem Shake mostra de forma laboratorial, pueril e histérica no que resulta o funcionamento dos neurônios espelhos. Também mostra no que resulta a falta do que fazer e o desejo de aparecer.

Pra quem não viu, eis aqui uma compilação de vídeos inspirados no vídeo original. Não deixa de ser pateticamente criativo, além de eloquente sobre várias questões psicológicas, sociais, psiquiátricas e antropológicas. É uma colagem incrível de figuras, gestos, símbolos, códigos da da cultura pop virtual contemporânea. É meio vertiginoso, na verdade. Cientistas sociais que se banqueteiem...

Só espero que o próximo viral do youtube não envolva a alegre ingestão de excrementos, servidos em porcelana chinesa da dinastia Ming... Imaginem as imitações fajutas da porcelana!

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