sábado, 13 de novembro de 2010

Eu te amo em câmera lenta correndo na praia

Sim, eu ouso. De um mero espécime de Homo sapiens sapiens que usa sopros e grunhidos articulados para se comunicar suponho poderem sair definições e ideias que tenham alguma coisa  a ver com isso que chamamos realidade...

But i’m not the only one, então:

Pensar que essa história de amor meloso e com corações voando ao redor de figuras de sombra em fundo vermelho nem sempre existiu é estranho para a maioria das pessoas. Hollywood e Manoel Carlos dão continuidade ao esquema segundo o qual o amor é um eterno e conturbado drama, a meta da vida de uma pessoa, o ápice da novela sentimental que cada um vive, e assim fazem parecer natural e normal algo que foi plenamente inventado lá pra depois da idade média...

Pois sim, amor como sinônimo de melosidade teve data de nascimento, e é interessante notar como se deu o parto... por falar em parto, vcs já viram um parto? Já ousaram visualizar em que circunstâncias todos os quase sete bilhões de seres humanos desse planeta vieram ao mundo? Pois vejam -  e depois pensem se o espetáculo sangrento do nascimento tem alguma coisa a ver com Julia Roberts e Richard Gere naquela cena da banheira.

“Vc está querendo dizer que a diferença entre a noite de amor entre um casal que se ama e o nascimento doloroso de uma criança é a mesma que existe entre o amor idealizado e o amor real?” – não, estou dizendo que há algo de histérico em querer ver Romeu e Julieta onde na verdade o que se tem é Lessy e Beethoven... É, pq seres humanos que somos, adoramos criar rituais e máscaras pro que fazemos sob os ímpetos do corpo; por isso há quem cinicamente diga “fazer amor” em vez de dizer “dar o ...”. “Ah! Agora vc vai dizer que não existe amor e sim atração física e que tudo se explica a partir de interesses, etc”... Não. Na verdade meu foco é o amor como uma roupa, como um estilo de comportamento que se deve usar. Como permite toda roupa que tenha siginificado social, qualquer um pode se passar pelo que não é usando a roupa que convém: um pervertido pedófilo com uma batina não é necessariamente um padre; um malandro vestido de terno e gravata não é necessariamente um representante do povo... Da mesma forma que um casal suspirante deitado em pétalas de rosa não é exatamente o retrato do amor.

Sendo assim, a nossa música, essa que ouvimos todo dia e toda hora em todo lugar, seria um tipo de máscara sonora: vcs já pararam pra pensar em como os temas relativos  a paixão, amor, carinho, dor de cotovelo e afins se repetem até a exaustão em todo estilo e gênero musical? Não existe música num CD que seja que não fale de saudade, de amor, de beijo, de alguma coisa do tipo... Já perceberam? Porque será? Isso seria uma prova de como o amor é importante, a prova de sua grandeza e de sua essencialidade absoluta e não sei mais o quê? Talvez. Mas então pq não se fala de comida? Porque não existem músicas e bandas inteiras consagradas a cantarem o macarrão, a noite de boca aberta babando no travesseiro, ou o ritmo correto de inspiração e expiração?

Nietzsche dá uma resposta dizendo que o amor romântico, ou a histeria generalizada em torno do amor meloso é uma válvula de escape, ou antes um sintoma da doença emocional causada pelo controle excessivo que desde que o mundo é mundo cristão as autoridades religiosas, via deuses, exercem sobre o corpo das pessoas...

Ahn?

É mais ou menos assim: menina pura entra na adolescência e sua mãe, ao primeiro sinal de peito nascendo diz que pensar em aproximar demais seu corpo do corpo de alguém do sexo oposto (que se dirá do mesmo sexo!) é pecado. A menina contrariada cresce pensando que seu corpo é algo que se deve gongar e dominar como se domina uma fera . Seu corpo é perigoso, e dar a ele exatamente o que ele quer, mesmo que o resultado aparente seja bom pra si e pra outra pessoa, deve ser algo abominado... De modo que toda ação que esteja ligada ao prazer desse corpo pecaminoso se transforma em motivo de culpa – culpa, culpa, culpa: sentimento que floresce como num jardim infinito no adubo da recriminação e das proibições...
(Continua...)

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