Comparar homens e formigas sempre
é muito pedagógico: quantidade, trabalho, organização coletiva (ok, eu sou
otimista), insignificância individual de ambos os grupos colam bem. A comparação
com bactérias, vermes e vírus é uma coisa meio Augusto dos Anjos e em geral,
nos dias de hoje, tem tom ético ecológico, mas serve também, principalmente aos
mais realistas (my opinion).
Claro que é bom deixar assente
que em tais comparações fica implícita uma ofensa essencial contra os seres em
questão, e não estou falando dos seres humanos...
Mas, enfim, a que comparar espécimes de
Homo Sapiens sapiens que, de modo tão espontâneo, diligente e patético
(patético não é necessariamente antônimo de engraçado ou divertido), se
entregam à imitação pura e simples de comportamentos que, sob as mais
diferentes perspectivas, não querem dizer inexatamente nada mais que um “pule
de um pé só” ou “cabeça pro lado, corpinho pro outro”? Efeito manada? Efeito
não-tenho-o-que-fazer?
Diretamente ao ponto, estou
falando dessa coisa viral chamada Harlem Shake. O resumo não é muito longo nem
complexo: grupo de amigos anônimos se remexe – como se dançassem – ao som de um
dance Techno de qualidade moderada; de uma não-coreografia que faz alusões ao
ato sexual, passam, com a mudança no ritmo do dance, a um remelexo parecido com
um ataque epilético ou crise de diarreia, ou as duas coisas juntas. Ponto. Por motivos
que nem os doutos mais doutos afirmariam serem os definitivos e exatíssimos,
esta cena de pouco mais de 30 segundos, postada no youtube, virou febre entre
milhões de outros Homo Sapiens sapiens.
A pergunta é: WHAT THE HELL?
Uma resposta possível é: les neurones
miroirs, ou, menos francófilo, neurônios espelho. Uma lida sobre o assunto, que
meus não-numerosos leitores farão em outro lugar, revelará que os neurônios
espelho são objeto de pesquisas recentes no campo de neurociência e de que se
diz estarem na base de comportamentos de imitação e de aprendizagem. Ela dança,
eu danço; ele sorri, eu sorrio também, ele chora, eu choro, ele boceja, eu
bocejo. É como se num nível inconsciente, fisiológico, o aparato neural e
muscular que somos estivesse predisposto a imitar o que vemos de uma maneira
muito mais que incontrolável. É bom lembrar que se não fosse essa capacidade “inata”
de imitação, não seríamos capazes de aprender, e portanto, de sermos seres
humanos, ou projetos disso. Os neurônios-espelho não se encontram apenas na
nossa espécie, claro.
Cientifices à parte, muito bem:
Harlem Shake mostra de forma laboratorial, pueril e histérica no que resulta o
funcionamento dos neurônios espelhos. Também mostra no que resulta a falta do
que fazer e o desejo de aparecer.
Pra quem não viu, eis aqui uma
compilação de vídeos inspirados no vídeo original. Não deixa de ser
pateticamente criativo, além de eloquente sobre várias questões psicológicas,
sociais, psiquiátricas e antropológicas. É uma colagem incrível de figuras, gestos, símbolos, códigos da da cultura pop virtual contemporânea. É meio vertiginoso, na verdade. Cientistas sociais que se banqueteiem...
Só espero que o próximo viral do
youtube não envolva a alegre ingestão de excrementos, servidos em porcelana
chinesa da dinastia Ming... Imaginem as imitações fajutas da porcelana!