Primeiro, que qualquer coisa que
envolva briga de grandes nomes de super heróis, sobretudo aqueles que marcaram
a sua infância, soa um tanto apelativo e chocante, sim,
soa... Confesso que, como não-leitor de HQs, quando soube de um filme com esse título,
minha primeira reação foi me perguntar: “Por que diabo esses dois brigariam?!”
As razões apontadas pelo trailer vieram - e, sinceramente, me pareceram de
fracas a ridículas... Mas como o trailer não é o filme, esperei pela história
toda e o resultado foi... ok.
O aviso de que não seja, nem
tenha sido, leitor de HQs serve para explicar minha ignorância sobre o fato de
Batman vs Superman ser a costura de várias histórias em uma só, envolvendo os
protagonistas, a Mulher Maravilha e, claro, o início da Liga da Justiça.
Deixando de lado os aspectos esotéricos dos fãs e dos entendidos das histórias precursoras
do filme, farei apenas uma análise impressionista, de leigo mesmo, da coisa
toda:
Motivo da briga: Batman, apenas
chocado e passado na manteiga com a destruição causada pelas brigas de rua do vândalo
Superman, decide que o da capa vermelha merece uns cascudos por matar pessoas
ao desarrumar a casa em suas estripulias. Junte-se a isso o fato de Bruce Wayne
já ser um riquinho chatinho perturbado da cabeça – que, no fundo, no fundo,
padece de uma grande inveja dos poderes do alienígena de Krypton, que pode matá-lo
brincando... De fato, convenhamos, talvez seja muita coisa pra digerir,
sobretudo pra um ser humano acostumado a ter tudo e pagar caro pelas bugigangas
hi-tech: ver um cara mais bonito, mais tudo, sambar e conquistar mais prestígio
do que uma pessoa vestida de morcego...
Conflitos psicológicos internos à
parte, e falando um pouco mais sério, no filme, mais que no trailer, e apelando
pra uma sensibilidade maior ao drama da vida, ao som de violinos, você até que
engole o motivo da briga entre os super-herois – ok, fight (se bem que,
procurar o outro pra conversar, pra conhecer seus dramas, entender que a
destruição foi justamente pra salvar o mundo [e não apenas uma cidade suja...],
não rolou né?... ok)... Os preparativos para o início da parte boa do filme, a
destruição, envolve a apresentação de um Lex Lutor pirado... e CHATO, umas
cenas lentas e desnecessárias, enfim, um enchimento de linguiça clássico. Então
vem a quebradeira – que não é tão boa assim na verdade; e, então, a parte em
que os inimigos da escola de ensino fundamental se tornam, do nada, best
friends forever... Não vou dar o núcleo do spoiler já dado, por vergonha
alheia. Enfim. Chega-se a um fim trágico, porém não surpreendente. O mundo tem
salvação – habemus Mulher Maravilha, ê! – mas vai ser complicado e “não perca
os próximos episódios”. Entusiastas adolescentes esboçam aplausos, mas a
audiência toda na sala sai em geral em silêncio. Mas os críticos profissionais,
não.
Não sei quem foi que disse que “o
papel dos críticos é criticar”. Pois procuraram coisas criticáveis e, de fato, as há demais
nesse filme. Porém, a maior parte das críticas são pesadas demais, e chegam a
ser injustas. Chegaram a chamar de fiasco... Não, não é um filme ruim e não é
um fiasco. Só por não ser O FILME, Batman vs Superman não pode ser classificado
como fiasco. Se a proposta era ser um retalho de grife de histórias prévias que
servirá de base pra outras histórias, talvez mais interessantes, parece que
cumpriu seu papel.
O século XXI é um século de
cansaço e exaustão da criatividade. Não sou eu quem digo – entendidos teóricos
da literatura, do cinema e de praticamente todas as artes dizem isso. Na
verdade, é história batida, pelo menos desde o fim do Império Romano – isso no
Ocidente, porque se falarmos de China e Índia... A questão é, pra inovar (cabem
aspas aí...), até Hollywood tem que se virar, e parece que a bola da vez é a
desconstrução da figura do herói – isto é, fazer a caveira dos bonitões fortões
bonzinhos. E, de quebra, incluir nessa desconstrução, reflexões
filosófico-religiosas light ou pesadas mesmo. É bom lembrar que esse tipo de
discussão já acontece em outros tipos de filmes e livros há muito tempo – quase
desde sempre. Mas lembremos também que estamos falando de Hollywood, de povão,
de mainstream. Chamar Super Man de deus, ou apresentar ao público a dissecação
do sentimento religioso, dizendo que a religião é um tipo de subterfúgio do ser
humano diante da realidade – talvez não pareça conversa muito simpática a muita
gente. E é isso que se vê em Batman vs Superman. Porém, a desconstrução é o que
mais chama a atenção: o superman nada mais é do que um alienígena deslocado,
que não consegue se adaptar ao planeta, nem sabe muito bem o que quer, tem
ataques de grandeza e um narcisismo mal disfarçado. No filme, vemos que ele não
é tão bonzinho assim, e mesmo o fato de ser bonzinho, simpaticozinho, não faz
dele um santo, já que num planeta de 7 bilhões de homo sapiens, salvar o gato
preso na árvore pode ter nenhuma utilidade prática diante de ataques terroristas suicidas
em algum lugar perdido do mundo.
O Batman, já sabemos que é um
desequilibrado. Encarna, na verdade, o arrogante de classe média alta que luta
contra o mal de forma meio paranoica – é como se acabar com o crime fosse mais
um show de travesti querendo abalar, do que algo necessário para o bom
funcionamento da sociedade – nem é preciso questionar aqui sobre quantos homens
mascarados e/ou de capa seriam necessários para lutar, de fato, contra o “mal”...
E essas últimas aspas se tornam sintomáticas se pensarmos no público assistindo
à briga entre dois heróis cuja integridade e caráter são duvidosos: o que é o
Bem? O que é o Mal? Cadê aquele meu herói bonito, bom e barato, sacrossanto,
puro, legal, equilibrado? O gato comeu?
Super heróis são projeções de angústias
e esperanças nossas. Quem não queria que o superman fosse seu pai (ou
vice-versa) durante a infância? Um povo quer ser cuidado por um herói assim
como a criança quer ser cuidada pelo pai – toda segurança, coragem, solução de
problemas emanando apenas de um ser super poderoso, invencível. Aí, vira e
mexe, pá: você descobre que aquela pessoa perfeita não é tão perfeita assim, e
que a projeção dos seus sonhos e anseios pode ser interrompida – porque a tela
que você encontrou (o namorado, o pai, a mãe, o amigo) não corresponde
exatamente aos parâmetros de tamanho, largura e cor minimamente adequados pra
uma boa ilusão...
Não sei – por um lado, acho que
as críticas pesadas e injustas a Batman vs Superman vêm, de um lado, de uma
rejeição, por parte dos críticos, desse flerte com Lars von Trier, ao refletir
cinicamente (mesmo que de passagem) sobre religião, e política também; e, de
uma cara de enjoo, por parte do público, diante da lama moral que é jogada na
figura dos heróis, que, pra muita gente, e ouso dizer que para a maioria,
deveria ser pura e imaculada, já que se vai ao cinema pra se divertir, comer
pipoca, namorar, e não pra se refletir sobre a vida, sobre a natureza humana,
e, pior ainda, sobre a natureza divina... (Beyoncé que o diga: críticos criticando: "Pra que ela vai falar de racismo e violência policial nas músicas dela se tudo o que nós queremos é bater cabelo e descer até o chão? Petralha! [adaptado]").
Veria de novo? Sim. No cinema?
Não – não vale um segundo ingresso. Mas é um filme ok. Vão lá. Vale à pena.
Talvez não em 3D... Whatever.
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