Aquela velha história: se você
visse um amigo seu, na sua frente, pegar uma arma e colocar na boca (como se
fosse fazer um sexo oral bem destrutivo) e dizer “Estou me matando, adeus!”, você
não pensaria duas vezes antes de arregalar os olhos e vomitar o discurso mais
efetivo do qual você dispusesse pra convencê-lo de como a vida é bela, etc e como
aquela atitude é estúpida e tal. Mas se em vez disso ele fosse poluindo os pulmões com fumaça, ou sujando o cérebro e o fígado com álcool, ou outras partes
do corpo com outras drogas, o discurso seria mais light ou talvez mesmo
inexistente...
Elizabeth Kolbert se põe na
segunda situação, mas num plano mais amplo: é como se ela contasse a história
de outras pessoas que destruíram, ou tiveram suas vidas destruídas, por
comportamentos errados e/ou tragédias fatais. No caso, tratam-se de cinco
grandes extinções ocorridas no planeta, desde que a vida surgiu; cinco grandes
eventos de assassinatos em massa de quase todas as espécies vivas. É como se por cinco vezes, a vida no planeta, com quase todos seus ecossistemas na
terra, no ar e na água, tivesse sido resetada, a biosfera formatada, forçando a
Vida a uma nova atualização.
Em algumas dessas vezes, a
formatação se originou com impacto de meteoros, ou por mudanças climáticas lentas mais
implacáveis, que acabaram por envenenar oceanos, esquentar ou esfriar o planeta
de uma forma tal que quase tudo o que era vivo, simplesmente moh-reu. A autora conta a história das tragédias biológicas da Terra com detalhes e da forma mais completa e acessível que a pesquisa científica
permite. Porém o foco dela, como o título do livro diz, é a sexta grande
extinção, causada por ninguém mesmo que... essa espécie arrogante de macacos sem pelo que vota em Bolsonaro...
Não dá pra saber até que ponto,
nos dias de hoje, as pessoas, o seu zé da bodega ou o Antônio do curso de
Letras ou o apresentador robótico e fingido do telejornal ou o trabalhador
anônimo no ônibus ou metrô, levam a sério a tal da “questão ambiental”. Estar
consciente das várias merdas que estamos fazendo com o planeta que nos pariu e
nos sustenta, parece ser algo que, em níveis variados, todo mundo faz.
Porém, da mesma forma que um fumante ou um alcoólatra sabe que está vacilando e
que, mais cedo ou mais tarde, a Vida vai cobrar pela forma com que trata o
próprio corpo, esse suicídio em slow motion que estamos cometendo não parece
alarmar tanto quanto devia os moradores dessa casa chamada Terra, o terceiro
planeta, a bola azul...
O discurso ecológico
frequentemente se reveste de uma aura piegas e chorosa - e não vou cair nessa
armadilha aqui. A questão na verdade é simples e clara e, em tempos de internet, só não vê quem não
quer o tamanho da nossa burrice em relação ao que somos (mais uma espécie entre
milhões de outras, que depende de praticamente todas as outras) e ao que
estamos fazendo conosco mesmos e, sobretudo, com os demais animais.
Pra quem
cresce aprendendo que nós somos os fodões do planeta é meio difícil engolir a
ideia que precisamos - vitalmente -, por exemplo, das abelhas, que são responsáveis pela
polinização de milhares de espécies vegetais das quais nos alimentamos – simplificando:
sem abelhas não tem comida. Ainda mais: apesar de todo mundo saber que cagar na
casa do vizinho é coisa de criança malcriada, nossos oceanos recebem toda hora, todo
dia, milhões de toneladas de lixo, e que o dióxido de carbono liberado pelas
nossas indústrias e carros se dissolvem na água do mar, fazendo com que a água
se torne a cada ano mais ácida... todos os peixinhos bonitinhos (Nemo e Dory) e
os feinhos também, e outros bichos que ninguém nem sabe que existem, vão
morrer, morrer, morrer... Aliás, já estão morrendo. Os corais estão desaparecendo. Sapos e pererecas sumindo. Mosquitos e
besouros se mudando de onde não deviam e causando estragos terríveis
aonde chegam... A lista de bostas feitas pelo Homo sapiens é enorme – leiam o
livro se quiserem ter uma ideia.
A impressão que se tem é que você
pode esfregar um Avatar mil vezes na cara das pessoas que o máximo que vai acontecer
é uma reflexão tristonha que dura alguns minutos no cinema e que não vai
resultar em nada mais que um papo profundo sobre o fim do mundo, entre
amigos...
Esse post aliás, integra esse “nada mais que”... De modo que se os
kbytes que o constituem sobreviverem e, casualmente, forem lidos por algo ou alguém (as
baratas que evoluírem depois do nosso unhappy end, ou alienígenas que visitarem as ruínas dos nossos monumentos), serão um atestado, ao mesmo tempo, da consciência que tínhamos de
como éramos inteligentes o suficiente pra saber o que estávamos fazendo conosco
– mas imensamente mais burros por não transformar esse conhecimento em ação
inteligente...
Que se foda. Detesto baratas mas
torço por elas.
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