terça-feira, 8 de outubro de 2013

As bactérias que são você

Não, apesar do título, esse não é um mais um post em que solto aquelas críticas ácidas contra a humanidade que se ilude achando que podemos viver felizes para sempre enquanto que exterminamos plantas e animais, e poluímos terra, ar e água como loucos de pedra que saem defecando pela casa toda, sorridentemente.

Também não vou falar de doença. No senso comum, falar de bactéria é falar de doença. Falar de bactéria é falar de sujeira, e, portanto, de desinfetante ou de antibiótico.

Queria falar de quem somos e de quem achamos que somos.

Desde criança a gente se acostuma a pensar que cada um de nós é uma espécie de exemplar maravilhoso de uma espécie animal evoluída e superior a todas as outras: quem nunca ouviu em um documentário qualquer, cientistas se referirem a seres humanos como o produto de uma evolução contínua que começou com vermes nadando no oceano, passando por lagartos e macacos,  e hominídeos obtusos e feiosos? É uma visão atraente pra muita gente: parece que esse é um dos poucos pontos em que religiosos e cientistas fundamentalistas concordam pacificamente: nós mandamos, we run the world, nós somos o suprassumo da natureza ou da criação...

Pra quem acredita (e no fundo, no fundo, pra quem não acredita tb...), Darwin foi um dos que baixaram a nossa bola. Antes dele, claro, houve Copérnico. Não éramos nem mais o centro do universo e nem o da natureza. Muitos põem na lista aquele senhor chamado Freud – mas como foi ele mesmo que tomou o lugar pra si, vou deixá-lo nadando em seu narcisismo e pular mais pra frente: pras nossas amigas bactérias.

É isso mesmo: amigas. Há muito tempo vc deve saber que dentro da sua barriga existe algo chamado flora intestinal. Deve saber que se essa flora for perturbada – durante uma infecção intestinal, por exemplo – as coisas desandam e ficam odorífica e dolorosamente desagradáveis... E apesar de “flora” nos fazer pensar em flores e borboletas coloridas voando dentro da nossa barriga, a verdade é que se tratam mesmo é de bactérias – esses bichinhos minúsculos que, simplesmente, estão por toda parte... e não há bactericida capaz de eliminá-las.

E quando digo em toda parte, é em todo canto mesmo: no ar, na terra, nos mares, no fogo... e não é só poesia: existem bactérias que vivem na estratosfera; existem outras que habitam no solo, responsáveis pela sua fertilização; e tem até bactéria no fundo do mar, no fundo mesmo, onde a luz do sol nunca chega, onde tudo é um breu eterno... e onde quem sustenta a vida de todos os outros animais são exatamente as bactérias.

“Sim, ok. Então o planeta é um lugar sujo e cheio de bactérias. Nós, seres humanos só evoluímos porque nos tornamos limpinhos...”. Não.

pesquisas mostrando que, na verdade, na verdade, as bactérias, pra todo lugar que se olhe, em toda espécie animal e vegetal que se considere, estão lá, lindas – não causando doenças e atrapalhando a vida – mas justamente o contrário, ajudando-a a se sustentar... Aliás, o correto nem é dizer “ajudar”, mas sustentar – sim, sem bactéria, não ha vida.

Cálculos simplórios dizem que a massa de bactérias no mundo (na solo, nas cidades, nas plantas, no ar) é da ordem de toneladas e toneladas. Se contarmos os oceanos, que cobrem 70% da superfície da Terra, a infinitude de toneladas se multiplica pra números que não podemos conceber...

Mas e daí? Ok, mesmo supondo que nascer, viver e morrer num mundo de bactérias não signifique nada pra vc (afinal de contas, o que o olho não vê, o coração não sente...), ainda tem a outra parte d ahistória – e voltemos às flores e borboletas da flora intestinal:

Descobriu-se, mais recentemente, que o número de bactérias no corpo humano passa dos bilhões, sendo que há quem diga que chega aos trilhões. Só pra ficar claro: isso é muito mais, umas dez vezes mais, do que o número de células do corpo. É mais ou menos assim: existe mais DNA de bactéria no seu corpo do que DNA humano. Não é legal? Aí vc pensa (espero que não pense, na verdade): “djabeh isso? Vou ter que tomar um coquetel de todos os antibióticos existentes pra matar tudo isso que me devora por dentro?” A resposta negativa é óbvia, mas não apenas pela flora intestinal – mas por causa do corpo todo...

Ainda não se sabe direito como, mas TODAS as bactérias presentes no corpo humano estão lá porque são necessárias: na boca, na pele, no estômago, no sangue, no cérebro... Cada uma tem uma função, e estão lá desde que nos entendemos por coisas vivas. Elas estão dentro até das nossas células: as mitocôndrias, que são, digamos, a central de energia de cada uma das bilhões de células do nosso corpo, se originam de bactérias, que, num passado remotíssimo, foram aprisionadas dentro das células... tanto é que têm DNA próprio...

Mas ainda tem gente que vai dizer: “E daí?”

E daí que por causa da importância do papel desse verdadeiro ecossistema dentro de cada um de nós, tem-se perguntado até que ponto as bactérias são responsáveis pelo que sentimos, e, portanto, pelo que somos... Certamente, vc já ouviu falar que “vc é aquilo que come” (na minha opinião, isso é um insulto pra quem come McDonalds lambendo os beiços... mas enfim). Também deve ter ouvido falar que isso faz todo o sentido: o excesso e/ou a ausência de certas vitaminas, sais minerias e outros elementos no organismo pode causar alterações de humor e, a longo prazo, de personalidade: alegria demais, depressão, irritação ou bem estar – ou seja, o que vc é depende MESMO do que vc come. Pois bem, descobriram-se algumas coisas mais:

Primeiro: que as bactérias da nossa colorida flora intestinal são diferentes em diferentes tipos de pessoas. E são diferentes de forma parecida como os tipos sanguíneos são diferentes. E essas diferenças dizem respeito à forma como o corpo digere e absorve os nutrientes da comida que comemos: estaria aí uma explicação de porque algumas pessoas comemo que querem e não engordam nunca; e porque outras pessoas têm que se torturar pra não engordar. Também estaria aí a explicação de porque algumas pessoas vivem tendo problema de intestino, ou problemas de pele, ou de sangue, etc. Parece exagero, mas de certa forma, tudo tem a ver com esse segundo EU que vive dentro de cada um de nós: bactérias...

Segundo: já se sabia que, depois do cérebro, a região do estômago e dos intestinos é a que mais libera neurotransmissores e hormônios na corrente sanguínea... Não é à toa que algumas emoções estão relacionadas à barriga – simplesmente não é só o cérebro quem manda no que vc sente, o intestino também!
E aí vem a parte de ficção científica: e nosso intestino tá cheio de quê? Isso: de bactérias. E adivinha o que se têm descoberto? Que elas também liberam neurotransmissores, ou seja: elas sabem falar a língua dos neurônios e das outras células do corpo. Uau, né?

Só pra não me alongar mais – e pra que é que serve isso tudo? Por que é que uma pessoa que vive para a Linguística, se interessa por bactérias e sua fantástica ubiquidade?

Primeiro porque sou curioso mesmo. Depois, pq acho interessante incluir na sequência de figuras que foram trazendo o ser humano ao seu devido lugar no Universo, Copérnico, Darwin e as bactérias.

Segundo, pq é fascinante pensar que não somos apenas o que pensamos que somos – que além de sermos essas pessoas funcionais e senhoras de si no dia-a-dia, somos um universo ambulante feito de seres que, em geral, desprezamos...

Terceiro: pensar que muitas das mazelas que nos atingem enquanto seres vivos podem estar relacionadas à nossa ignorância ou desrespeito ao modo como funcionamos, ou seja, como ambiente para outros seres vivos, é algo que pode ser considerado, no mínimo, de vital importância...

E por último, é poético e bonito nos vermos como miniatura do que o nosso planeta é: a moradia de várias espécies que, para conservar  a vida, devem viver em equilíbrio e em paz...

Aleluia!

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Pessoas, carros, viadutos e, de novo, jumentos


Pessoas

Seres humanos, essa interessante espécie animal da qual (orgulhosa e vergonhosamente) faço parte. Sabe-se que existem milhares de espécies de insetos no planeta, de todos os tipos, cores, índoles e tamanhos – me pergunto se a variedade entre pessoas do mundo todo é maior ou menor... ou alguém duvida que existam pessoas-barata, pessoas-borboleta, pessoas-formiga, cupim, louva-deus, esperança, cigarra, gafanhoto...?
Adoro usar a natureza como fonte de comparações e metáforas. Tem um inseto por exemplo, uma espécie de vespa – que acho até que serviu de inspiração pro filme Alien – que simplesmente pôe seus ovos no interior do corpo de uma lagarta viva. Alguns dias depois, os ovos eclodem, e as larvinhas de vespa se alimentam da lagarta, devorando-a de dentro pra fora – viva da silva... Pelo menos até que a prole saia e virem novas vespinhas simpáticas e aliens...

Já compararam nossas sociedades humanas com formigas, até eu já escrevi umas coisinhas sobre isso. Devo ter falado tb sobre como essa comparação é inadequada: pois formigas trabalham para que as formigas, todas as formigas, vivam – aquela coisa meio “comunista” de “o importante é o formigueiro”... Bem, mas elas vivem. Não me sentiria muito bem se os nossos governantes nos vissem como formigas – que devem trabalhar pelo “bem comum” (que bem comum?), abandonando a sua individualidade e coisa e tal. Mas também não me apetece muito que nossos governantes se comportem como parasitas, verdadeiras lombrigas solitárias (não são mais insetos, mas tudo bem), nos devorando por dentro, se alimentando vorazmente dos 37% de impostos que pagamos no feijão ou na farinha... e transformando isso tudo, por meio de processos cínicos – a corrupciossíntese – em caviar e lagosta...

Se chá de alho ou os remédios anuais (leia direito!) pra verme não estão resolvendo muito, que tal tentarmos a lendária pílula do mato: dizem que – no caso de cães – ou ela cura o bicho ou mata de vez... Mas as madames vão gritar loucas: pra que mexer nas estruturas de tudo? Pra que mudar hábitos administrativos e corporativos que vêm desde as sesmarias? O ditado que vale nesta cidade e neste país, nesse momento é: é mais lucrativo remediar do que prevenir.


Carros

Será que mister Ford suspeitava que um dia suas máquinas de transporte pesadas e poluidoras um dia se tornariam mais importantes do que seres humanos? Não vou dizer que duvido, porque não sei. Também não vou dizer que meu sonho secreto é destruir todo e cada um dos automóveis que circulam no planeta. A nossa civilização do jeito que é hoje precisa de velocidade, precisa se locomover: #fato (pra usar essa irritante hashtag adolescente). Mas ousaria dizer que quando ele teve a ideia de produzir máquinas de transporte em série, pensava, além de no lucro, na função da coisa: ir de um lugar ao outro mais rápido, mais comodamente. Em 1900 e pouco, preocupações sobre meio ambiente e mobilidade urbana pareciam sem sentido. Pois muito bem: benvindo à Fortaleza do século XXI: praia, sol, asfalto, ruas estreitas, carros e carros e carros... E na sequência vêm: stress, brigas no trânsito, acidentes, poluição, barulho e, claro, feiura – sim, não sei qual é a beleza de ver sob o sol escaldante uma fila infinita de carros fritando e abarrotando a cidade...

Os mais otimistas e amantes de carros e de gasolina se concentrarão num dos elementos da sequência anterior: estradas, ruas, avenidas – ou antes, na falta delas. O problema é esse, dirão: a falta de novas ruas e avenidas e, claro, viadutos. Aí novamente entram as comparações biologizantes: todo mundo sabe que pra qualquer espécie parasita, quanto mais hospedeiro, mas parasita, ou seja: quanto mais estrada, mais carro,  já que o sonho tão bem cultivado pela tia Publicidade nas emergentes classes C e E é ter um carro, qualquer carro, qualquer preço, mesmo que não seja necessário. Em Fortaleza são mais de cem novos carros por dia injetados nas ruas da cidade, a maioria levando uma ou duas pessoas, em distâncias menores que alguns quilômetros... É preciso ser um gênio pra sacar que esse esquema não tem futuro?

Não tenho nada contra carros. Na verdade, eu os amo nos fins de semana, e recentemente descobri que em viagens, é uma dádiva – e não os trocaria pelos cavalos ou pelas carroças que predominaram até menos de um século atrás, transportando as pessoas a menos de 50 km por hora.

Mas eu amo bicicletas. Vou surpreender alguém se disser que em muitos percursos longos e congestionados da cidadade ando mais rápido do que o trânsito cheio de atrasados e estressados? E numa sociedade de gordos e inertes, onde se paga uma fortuna pra pedalar na frente de uma televisão, e onde sempre se reclama de stress e de falta do que fazer, a bicicleta me faz, no fim de uma boa volta, me sentir pronto pra tudo. Mas a apologia à bike deixo pra outor post. Falemos de viadutos.


Viadutos

É claro que há uma questão estética e cultural no meio das discussões sobre o Cocó e sobre o nosso querido viaduto: se eu digo “progresso”, vc pensa em duas pessoas sorridentes andando de bicicleta ou em carros velozes cruzando um viaduto? Normal, é isso que vemos em todo lugar, num tipo mórbido e meio inconsciente de “propaganda urbanística”: todos devemos ser como São Paulo: cinzenta, cheia de gente e de viadutos... Ousaria chutar que deve existir doido que curte um engarrafementozinho no fim de tarde: que prazer impagável, hein, curtir um som no ar condicionado enquanto que os peões passam suados do lado de fora, voltando do trabalho? Pois bem, aproveitemos essa imagem e pensemos: como se discute bem estar no trÂnsito, mobilidade social, humanização da cidade, com uma pessoa que tenha uma mentalidade dessas? Uma pessoa que vê o cinza e o concreto como modelo de beleza urbana? Os princípios que cada um dos representantes dos lados da discussão sustenta são, a priori, diferentes: um quer a diferença, a distância, o exclusivo, o caro, a divisão; o outro pensa mais em todos vivendo saudáveis num espaço urbano que não deixe de ser humano. Não estou falando de anjos tocando harpas debaixo de árvores na Praça do Ferreira: só estou falando em lembrar que: CIDADES SÃO FEITAS POR SERES HUMANOS, logo (por favor, corrijam se eu estiver errado), essa p*rra de cidade também deveria ser feita PARA seres humanos. Carros são objetos, meios, máquinas – os habitantes de Fortaleza são os fortalezenses, nós respiramos oxigênio e não CO2; nós temos pernas e não rodas nos pés.

Pois bem, viadutos. Não sou engenheiro, nem administrador de empresas – mas tenho cérebro e vejo coisas e acho que aprendi a pensar ao longo de trÊs décadas, então digo o seguinte:

Quando se quer fazer alguma coisa, dá pra fazer. “Não dá pra fazer um túnel perto do Rio Cocó porque tudo alaga”. Já fizeram um túnel debaixo de um mar. “Mas vai ter que desapropriar dois prédios”. Desapropriaram muito mais do que isso, e de maneira não tão simpática.. ah, mas era na periferia! “Mas ninguém vai querer andar de bicicleta porque o sol é muito quente”. Em Amsterdam senhoras de 80 anos andam de bicicleta, executivos vão ao trabalho de bike, famílias andam de bike juntas – e ninguém morre; a cidade é silenciosa, o ar é bom de respirar, tem árvore até dar uma dor. “E o sol... tá pôdi?” Existe um tipo de máquina natural que tem a mágica capacidade de transformar água, gás carbônico, minerais e luz em oxigênio, e tudo isso de graça e sobretudo, dando de bônus uma cobertura verde muito bonita que produz sombras que já salvaram vidas, inclusive às daqueles que jogaram spray de pimenta na cara de cidadãos descontentes uns dias atrás... Ah, mas claro, plantar árvores ao lado de ciclovias é uma coisa mágica, que necessita de enoooooormes investimentos, muito maiores do que aqueles investidos ao longo dos 20 ANOS que foram gastos pra construir UMA LINHA do metrô de Fortaleza...

Mas como convencer o seu Zé ou o estudante de medicina Francysgleysson a abandonarem seus carros e andar de bike? Publicidade: ou como vc acha que nos fazem comprar aparelhos celulares caros, roupas de marca e outros objetos cujo uso real que fazemos no dia a dia não justifica a compra? Em Amsterdam o processo durou décadas. “Mas Fortaleza não é Amsterdam”. Isso é bem verdade: mas cadê o nosso jeitinho brasileiro? A gente num adora furar fila pra chegar na frente primeiro? Pq não aproveitar essa tendência  a querer se dar bem e pular a fase da cidade totalmente parada no trânsito, do dinheiro gasto em viadutos e  obras faraônicas superfaturadas, dos rodízios irritantes e etc, enfim, e passar logo pra fase onde Fortaleza é uma cidade cheia de sol e mar e árvores, onde só anda de carro quem realmente precisa ir pra longe... onde quem pensa direito prefere economizar 1000 reais de gasolina por mês se mantendo em forma de graça numa bike?

Uma sugestão de resposta vem a seguir.


Jumentos

Talvez hoje Jesus tivesse nascido dentro de um carro, já que pro recenseamento obrigatório em Belém certamente as rodovias e viadutos estariam cheios de carros... Isso se Maria não morresse num acidente devido a um motorista bêbado ou outro agressivo saindo do carro com uma chave de fenda na mão...

Já falei antes e repito: jumentos são criaturas formidáveis, inteligentes para o que existem: viver como jumentos. Nós os escravizamos pra turbinar a nossa civilização, e agora, atribuir-lhes a “vergonha” de serem burros, no sentido de imprestáveis, estúpidos, etc, é simplesmente... burro: montamos literalmente nos coitados durante séculos (e ainda hoje, of course) e cuspimos no lombo que nos susteve?

Mas dobrando-me À força da linguagem e do hábito: sabe porque seu Zé não vai abadonar seu carro recém comprado, nem o Carlos Eduardo Francyscgleysson nunca que vai vender o carro que ganhou do pai, nem os funcionários da prefeitura vão parar de “protestar” a favor da construção de um viaduto em cima do que deveria ser uma reserva ambiental?

Sabe porque vamos aumentar a temperatura média da cidade trocando terra por asfalto, erguendo torres e estradas de concreto, derrubando árvores em vez de plantar, aplaudindo o cinza do sul enquanto temos esse verde-azul lindo do mar gritando pra sermos mais legais e felizes e naturais?

Sabe porque? Porque, como dizem as ceguinhas de Campina Grande, “a pessoa é para o que nasce”, e nem para sermos jumentos (comendo capim e carregando salvadores nos lombos) nascemos.

E mais uma vez, me rendendo às nossas expressões regionais (eloquentes de um jeito que chega a emocionar), digo: “Queima, quengaral!!! Pega fogo cabaré!” Bora asfaltar logo o Aterro da Praia de Iracema todo! Dava um estacionamento só a massa, ó! E prefeito, faz a mesma coisa com o Cocó todo! OS frequentadores do Iguatemi agradecem... mas não agradecem mais do que as construtoras e os eternos bastardos do Estado, que não largam essas tetas fartas de jeito nenhum!

#ViadutoSim

#JumentosSim

sexta-feira, 5 de julho de 2013

"O seu Zé usa papel higiênico dupla face, câmbio!"

Um belo dia, 17 anos atrás, fui interpelado pela minha mãe a fim de dar esclarecimentos sobre o conteúdo secreto de um diário que analítico-romanticamente escrevia na época (até hoje na verdade)... Claro que o tom foi de conversa familiar e não de Gestapo ou FBI, mas certamente os sentimentos não foram de alegria e bem estar. Na verdade, me senti ultrajado, apesar de ter sido criado para contar tudo aos pais (diferente de hoje, em que adolescentes se transformam em reis tiranos de suas famílias...). 

A sorte é que, tendo lido na Superinteressante (argh) que Leonardo Da Vinci escrevia da direita à esquerda, o que exigia um espelho para que se lesse seus escritos, resolvera imitá-lo, e essa criptografia primitiva me poupou de mais ultraje e níveis mais elevados de constrangimento...

A questão é que, apesar de não constar nas linhas do meu diário a contabilidade dos lucros com guerras sujas e desnecessárias, os conchavos imundos para derrubar presidentes ou negociar áreas de pré-sal com candidatos de direita à presidência de países americanos, e coisas do tipo, me senti muito mal e atacado nos meus direitos...

Mas não é bem de Julian Assange e de Edward Snowden e sua relação com os EUA e a Europa que queria falar, mas sim sobre o que este último revelou de forma límpida e bombástica a quem interessar possa: nós somos vigiados o tempo todo, em tempo real, online. E por quem? Por um Estado. É a paranoia-pesadelo Big Brother confirmada em alto e bom som. Teorias da conspiração já gritavam isso tudo - mas o carimbo de true story baseado na revelação da existência do Prism, dá o que pensar...

Pensar o quê? Há quem pense dois segundos e conclua que "tudo bem, não tenho nada a esconder". Certo, nem eu... Em tese. Em que pode me prejudicar saber que, além das corporações online (que por meio de entrecruzamento de dados conhecem quase tudo sobre a sua, a minha e as nossas pessoas), agora governos estão cientes dos livros e aplicativos que comprei mês passado? Aparentemente, nada. Mas e se além disso, fico sabendo que eles acompanham cada um dos meus posts e das minhas mensagens privadas, e os dos meus amigos também, sobre temas como "revolução no Brasil", "ditadura capitalista americana", etc... Mais uma vez, a resposta pode ser "Nada demais". Mas pensemos mais alguns segundos: o segredo da informação não é a própria, enquanto unidade em si, mas os cruzamentos, as combinações que se fazem. Lembrem do Google Earth: muito legal vc poder visitar cidades do mundo todo na tela do computador, do celular, do tablet, etc. Mas raciocinemos: se uma empresa como a Google disponibiliza, para meros cidadãos como vc e eu, o mundo todo numa resolução cada vez maior, imagine o que Obama não deve poder visualizar no seu Macbook ou iPad na White House? E tem mais: uma ou duas vezes por mês saem notícias sobre nanorobôs do tamanho de insetos encontrados por participantes de manifestações pelo mundo, microfones descobertos em embaixadas, novas tecnologias que permitem ter acesso a tudo e a todos em todo lugar, a qualquer minuto...

Há um mês, isso tudo seria pura teoria da conspiração, mas agora, depois do Prism, é, no mínimo bom senso e lógico acreditar que nesse exato minuto vc pode estar sendo observado - visualmente e virtualmente - , nem que seja por acaso, por um técnico (humano ou não) de algum ponto do solo americano...

Esse pensamento não me agrada de jeito nenhum. Uma coisa é vc ir ao shopping e saber que um segurança pode estar dando o zoom na bunda da sua amiga ou se divertindo com o corte de cabelo de alguém. Outra coisa é saber que um país que não hesita muito em atacar nações ideológica e fisicamente por pura ambição, está monitorando cada palavra que vc digite ou fale... E isso com a anuência de empresas a quem vc confia simplesmente boa parte da sua vida, como Google e Facebook.

As implicações políticas, psicológicas, sociais da revelação desse Big Brother mundial e cínico vão além do alcance da minha capacidade de reflexão. O que posso dizer é que isso não é certo. Não é certo um país ter tanto poder sobre todos os outros; não é certo um país saber tanto sobre todo mundo. Por enquanto os EUA são uma ditadura capitalista light - mas e se der a louca e eles decidirem, assim, do nada, que vão deixar de serem bonzinhos e começarem uma campanha publicitária muito bem articulada (já que possuem um volume de informações infinito sobre o nosso país) em que o Brasil seja apresentado como um perigo para a ordem mundial e esteja desenvolvendo armas nucleares e etc? Quem poderá nos defender? O Chapolin? 

Ok, nível de paranoia acendeu o sinal amarelo... mas não sem base empírica, que fique claro.

Para fechar a cadeia de ideias do post:

Há um livro do gênio, mestre, magnânimo autor de ficção científica, Arthur C. Clarke, chamado, em inglês, The Light of Other Days. Super resumidamente, conta-se a história de uma máquina, criada num futuro distante, que permite a visualização do que aconteceu em qualquer lugar, em qualquer momento do passado. De início, tal máquina é utilizada apenas por governos e universidades com fins científicos e bélicos, claro. Mas como aconteceu com a internet, a visão capitalista do inventor da máquina, um homem inescrupuloso do universo da mídia, transforma o aparelho em algo popular, e, depois de alguns anos, qualquer cidadão passa a ter acesso ao dispositivo de visualização do passado. As consequências são inúmeras e profundamente sísmicas: imagine vc poder assistir a traições, crimes, mortes, cenas de sexo, de alegria, etc, etc, etc, tudo numa tela, tudo exatamente como aconteceu - o passado como de fato foi diante de seus olhos. Ou seja, não há mais possibilidade de existir mentira, não adianta mais pensar em enganar ou ocultar fatos - mais cedo ou mais tarde tudo o que se está fazendo no presente será visualizado,  num futuro próximo ou distante, por um observador onipresente... Para se ter uma ideia das transformações que ocorrem nas sociedades humanas, aconselho vivamente a leitura desse livro. Como todas as histórias de Clarke, ela é muito bem contada e a cada página vc se assombra diante do brilhantismo e da inventividade do autor.

Conectando o enredo do história acima com o enredo da história do agora, a diferença básica que se sobressai é que no livro de Clarke, todos sabem de tudo - o que configura um tipo de democracia hiperbólica do conhecimento, ou antes, uma tirania espaço-temporal da informação... No nosso hoje, ocorre outra coisa: alguns governos sabem demais da vida de quase todos, e dado que sabemos muito pouco ou quase nada do que realmente pretendem esses defensores da paz e da liberdade, é muitíssimo adequado pensar que vivemos numa das piores ditaduras da história - tão bem aplicada e manejada, tão bem articulada e abafada por narcóticos culturais (Hollywood, Apple, Samsung, Chrysler...) que nós mal nos apercebemos dela...

Viva la revolución!

Viva la paranoia!