Pessoas
Seres humanos, essa interessante
espécie animal da qual (orgulhosa e vergonhosamente) faço parte. Sabe-se que
existem milhares de espécies de insetos no planeta, de todos os tipos, cores, índoles
e tamanhos – me pergunto se a variedade entre pessoas do mundo todo é maior ou
menor... ou alguém duvida que existam pessoas-barata, pessoas-borboleta,
pessoas-formiga, cupim, louva-deus, esperança, cigarra, gafanhoto...?
Adoro usar a natureza como fonte
de comparações e metáforas. Tem um inseto por exemplo, uma espécie de vespa –
que acho até que serviu de inspiração pro filme Alien – que simplesmente pôe
seus ovos no interior do corpo de uma lagarta viva. Alguns dias depois, os ovos
eclodem, e as larvinhas de vespa se alimentam da lagarta, devorando-a de dentro
pra fora – viva da silva... Pelo menos até que a prole saia e virem novas
vespinhas simpáticas e aliens...
Já compararam nossas sociedades
humanas com formigas, até eu já escrevi umas coisinhas sobre isso. Devo ter
falado tb sobre como essa comparação é inadequada: pois formigas trabalham para
que as formigas, todas as formigas, vivam – aquela coisa meio “comunista” de “o
importante é o formigueiro”... Bem, mas elas vivem. Não me sentiria muito bem
se os nossos governantes nos vissem como formigas – que devem trabalhar pelo “bem
comum” (que bem comum?), abandonando a sua individualidade e coisa e tal. Mas também
não me apetece muito que nossos governantes se comportem como parasitas,
verdadeiras lombrigas solitárias (não são mais insetos, mas tudo bem), nos
devorando por dentro, se alimentando vorazmente dos 37% de impostos que
pagamos no feijão ou na farinha... e transformando isso tudo, por meio de
processos cínicos – a corrupciossíntese – em caviar e lagosta...
Se chá de alho ou os remédios
anuais (leia direito!) pra verme não estão resolvendo muito, que tal tentarmos
a lendária pílula do mato: dizem que – no caso de cães – ou ela cura o bicho ou
mata de vez... Mas as madames vão gritar loucas: pra que mexer nas estruturas
de tudo? Pra que mudar hábitos administrativos e corporativos que vêm desde as
sesmarias? O ditado que vale nesta cidade e neste país, nesse momento é: é mais
lucrativo remediar do que prevenir.
Carros
Será que mister Ford suspeitava
que um dia suas máquinas de transporte pesadas e poluidoras um dia se tornariam
mais importantes do que seres humanos? Não vou dizer que duvido, porque não
sei. Também não vou dizer que meu sonho secreto é destruir todo e cada um dos
automóveis que circulam no planeta. A nossa civilização do jeito que é hoje
precisa de velocidade, precisa se locomover: #fato (pra usar essa irritante
hashtag adolescente). Mas ousaria dizer que quando ele teve a ideia de produzir
máquinas de transporte em série, pensava, além de no lucro, na função da coisa:
ir de um lugar ao outro mais rápido, mais comodamente. Em 1900 e pouco,
preocupações sobre meio ambiente e mobilidade urbana pareciam sem sentido. Pois
muito bem: benvindo à Fortaleza do século XXI: praia, sol, asfalto, ruas
estreitas, carros e carros e carros... E na sequência vêm: stress, brigas no
trânsito, acidentes, poluição, barulho e, claro, feiura – sim, não sei qual é a
beleza de ver sob o sol escaldante uma fila infinita de carros fritando e abarrotando
a cidade...
Os mais otimistas e amantes de
carros e de gasolina se concentrarão num dos elementos da sequência anterior:
estradas, ruas, avenidas – ou antes, na falta delas. O problema é esse, dirão:
a falta de novas ruas e avenidas e, claro, viadutos. Aí novamente entram as
comparações biologizantes: todo mundo sabe que pra qualquer espécie parasita,
quanto mais hospedeiro, mas parasita, ou seja: quanto mais estrada, mais
carro, já que o sonho tão bem cultivado
pela tia Publicidade nas emergentes classes C e E é ter um carro, qualquer carro,
qualquer preço, mesmo que não seja necessário. Em Fortaleza são mais de cem
novos carros por dia injetados nas ruas da cidade, a maioria levando uma ou
duas pessoas, em distâncias menores que alguns quilômetros... É preciso ser um
gênio pra sacar que esse esquema não tem futuro?
Não tenho nada contra carros. Na
verdade, eu os amo nos fins de semana, e recentemente descobri que em viagens,
é uma dádiva – e não os trocaria pelos cavalos ou pelas carroças que
predominaram até menos de um século atrás, transportando as pessoas a menos de
50 km por hora.
Mas eu amo bicicletas. Vou surpreender
alguém se disser que em muitos percursos longos e congestionados da cidadade
ando mais rápido do que o trânsito cheio de atrasados e estressados? E numa
sociedade de gordos e inertes, onde se paga uma fortuna pra pedalar na frente
de uma televisão, e onde sempre se reclama de stress e de falta do que fazer, a
bicicleta me faz, no fim de uma boa volta, me sentir pronto pra tudo. Mas a
apologia à bike deixo pra outor post. Falemos de viadutos.
Viadutos
É claro que há uma questão estética
e cultural no meio das discussões sobre o Cocó e sobre o nosso querido viaduto:
se eu digo “progresso”, vc pensa em duas pessoas sorridentes andando de
bicicleta ou em carros velozes cruzando um viaduto? Normal, é isso que vemos em
todo lugar, num tipo mórbido e meio inconsciente de “propaganda urbanística”:
todos devemos ser como São Paulo: cinzenta, cheia de gente e de viadutos... Ousaria
chutar que deve existir doido que curte um engarrafementozinho no fim de tarde:
que prazer impagável, hein, curtir um som no ar condicionado enquanto que os
peões passam suados do lado de fora, voltando do trabalho? Pois bem,
aproveitemos essa imagem e pensemos: como se discute bem estar no trÂnsito,
mobilidade social, humanização da cidade, com uma pessoa que tenha uma
mentalidade dessas? Uma pessoa que vê o cinza e o concreto como modelo de
beleza urbana? Os princípios que cada um dos representantes dos lados da discussão sustenta são, a priori, diferentes: um
quer a diferença, a distância, o exclusivo, o caro, a divisão; o outro pensa
mais em todos vivendo saudáveis num espaço urbano que não deixe de ser humano. Não
estou falando de anjos tocando harpas debaixo de árvores na Praça do Ferreira:
só estou falando em lembrar que: CIDADES SÃO FEITAS POR SERES HUMANOS, logo
(por favor, corrijam se eu estiver errado), essa p*rra de cidade também deveria
ser feita PARA seres humanos. Carros são objetos, meios, máquinas – os habitantes
de Fortaleza são os fortalezenses, nós respiramos oxigênio e não CO2; nós temos
pernas e não rodas nos pés.
Pois bem, viadutos. Não sou
engenheiro, nem administrador de empresas – mas tenho cérebro e vejo coisas e
acho que aprendi a pensar ao longo de trÊs décadas, então digo o seguinte:
Quando se quer fazer alguma
coisa, dá pra fazer. “Não dá pra fazer um túnel perto do Rio Cocó porque tudo alaga”. Já fizeram
um túnel debaixo de um mar. “Mas vai ter que desapropriar dois prédios”.
Desapropriaram muito mais do que isso, e de maneira não tão simpática.. ah,
mas era na periferia! “Mas ninguém vai querer andar de bicicleta porque o sol é
muito quente”. Em Amsterdam senhoras de 80 anos andam de bicicleta, executivos
vão ao trabalho de bike, famílias andam de bike juntas – e ninguém morre; a
cidade é silenciosa, o ar é bom de respirar, tem árvore até dar uma dor. “E o
sol... tá pôdi?” Existe um tipo de máquina natural que tem a mágica capacidade
de transformar água, gás carbônico, minerais e luz em oxigênio, e tudo isso de
graça e sobretudo, dando de bônus uma cobertura verde muito bonita que produz
sombras que já salvaram vidas, inclusive às daqueles que jogaram spray de
pimenta na cara de cidadãos descontentes uns dias atrás... Ah, mas claro,
plantar árvores ao lado de ciclovias é uma coisa mágica, que necessita de
enoooooormes investimentos, muito maiores do que aqueles investidos ao longo dos
20 ANOS que foram gastos pra construir UMA LINHA do metrô de Fortaleza...
Mas como convencer o seu Zé ou o estudante
de medicina Francysgleysson a abandonarem seus carros e andar de bike?
Publicidade: ou como vc acha que nos fazem comprar aparelhos celulares caros,
roupas de marca e outros objetos cujo uso real que fazemos no dia a dia não
justifica a compra? Em Amsterdam o processo durou décadas. “Mas Fortaleza não é
Amsterdam”. Isso é bem verdade: mas cadê o nosso jeitinho brasileiro? A gente
num adora furar fila pra chegar na frente primeiro? Pq não aproveitar essa
tendência a querer se dar bem e pular a
fase da cidade totalmente parada no trânsito, do dinheiro gasto em viadutos e obras faraônicas superfaturadas, dos rodízios
irritantes e etc, enfim, e passar logo pra fase onde Fortaleza é uma cidade
cheia de sol e mar e árvores, onde só anda de carro quem realmente precisa ir
pra longe... onde quem pensa direito prefere economizar 1000 reais de gasolina
por mês se mantendo em forma de graça numa bike?
Uma sugestão de resposta vem a seguir.
Jumentos
Talvez hoje Jesus tivesse nascido
dentro de um carro, já que pro recenseamento obrigatório em Belém certamente as
rodovias e viadutos estariam cheios de carros... Isso se Maria não morresse num
acidente devido a um motorista bêbado ou outro agressivo saindo do carro com
uma chave de fenda na mão...
Já falei antes e repito: jumentos
são criaturas formidáveis, inteligentes para o que existem: viver como jumentos.
Nós os escravizamos pra turbinar a nossa civilização, e agora, atribuir-lhes a “vergonha”
de serem burros, no sentido de imprestáveis, estúpidos, etc, é simplesmente...
burro: montamos literalmente nos coitados durante séculos (e ainda hoje, of
course) e cuspimos no lombo que nos susteve?
Mas dobrando-me À força da
linguagem e do hábito: sabe porque seu Zé não vai abadonar seu carro recém
comprado, nem o Carlos Eduardo Francyscgleysson nunca que vai vender o carro
que ganhou do pai, nem os funcionários da prefeitura vão parar de “protestar” a
favor da construção de um viaduto em cima do que deveria ser uma reserva
ambiental?
Sabe porque vamos aumentar a
temperatura média da cidade trocando terra por asfalto, erguendo torres e
estradas de concreto, derrubando árvores em vez de plantar, aplaudindo o cinza
do sul enquanto temos esse verde-azul lindo do mar gritando pra sermos mais
legais e felizes e naturais?
Sabe porque? Porque, como dizem
as ceguinhas de Campina Grande, “a pessoa é para o que nasce”, e nem para
sermos jumentos (comendo capim e carregando salvadores nos lombos) nascemos.
E mais uma vez, me rendendo às
nossas expressões regionais (eloquentes de um jeito que chega a emocionar),
digo: “Queima, quengaral!!! Pega fogo cabaré!” Bora asfaltar logo o Aterro da
Praia de Iracema todo! Dava um estacionamento só a massa, ó! E prefeito, faz a
mesma coisa com o Cocó todo! OS frequentadores do Iguatemi agradecem... mas não
agradecem mais do que as construtoras e os eternos bastardos do Estado, que não
largam essas tetas fartas de jeito nenhum!
#ViadutoSim
#JumentosSim
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