sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Saindo do armário – uma história cativante e emocionante

Andando assim pela rua, esse rapaz nos seus 20 e poucos anos não aparenta ter sido o que era há apenas alguns dias: “Eu vivia trancado num mundo fechado, sabe? Vivia atrás de máscaras... Algumas a sociedade me forçou a criar... Outras eu criei pra me defender e me sentir mais forte... Mas era só uma ilusão...”

Francysgleusson Armandino (nome fictício) nasceu numa família de classe média. Estudou em escolas particulares e públicas. Ainda criança, pais e professores perceberam algo diferente nele. Hoje ele mesmo conta que também se sentia diferente: “Eu chorava de vez em quando sozinho. Olhava meus amigos, principalmente na adolescência e pensava: eu não sou como eles, feliz, tranquilo, não tenho namorada... Todo mundo pertencia a uma família rica que vivia em festas e eventos importantes... Eu não tinha nada disso... Me sentia muito mal...”

As situações adversas em que passou a viver por conta do jeito diferente que identificava em si mesmo, levaram Francysgleusson a tentar ser como os outros. Num esforço sobre-humano, tentou mimetizar, imitar os comportamentos que via ao ser redor, aqueles que se consideravam os "corretos". Foi nesse momento, conta ele, que começou o inferno na sua vida, que ele disfarçava de céu tão bem, que ninguém, aparentemente, notava.

“Eu então passei a ser o bem sucedido graduado em Direito. Saía todos os dias para lugares incríveis, com
pessoas lindas, bebendo drinks exóticos e caros, em festas exclusivas. Vivia sorrindo em poses dignas de capa de revista. Tudo o que eu postava recebia centenas de curtidas, até de pessoas que eu sabia que não gostavam de mim. No meu trabalho, eu era o melhor. Meu currículo online era extenso e cheio nomes pomposos de empresas onde todo mundo queria trabalhar. Entre as minhas centenas de contatos no facebook estavam inclusive celebridades locais e nacionais. Meus gostos musicais eram elogiados, todo mundo curtia os filmes que eu via... No dia a dia eu andava sempre bem humorado, e não lembro de precisar de ninguém para conversar sobre coisas tristes – eu nunca estava triste. Nunca precisei pedir desculpas, porque eu não cometia erros. E nem admitia erros! Ligar pra alguém sem antes ser procurado? – nunca! Usar frases como “gosto de vc”, “estou com saudade”, “não vai embora, tá cedo” – não, não estavam no meu vocabulário. Eu me sentia bem assim, sabe. Me acostumei a ser essa pessoa perfeita, essa entidade emblemática – me sentia como o protagonista de uma série americana que falava sobre pessoas populares e bem sucedidas...”

E Francysgleusson levaria a sua vida assim por tempos indefinidos... Se não fossem os efeitos colaterais de um tal estilo de vida. Postar fotos sorridente enquanto estava com vontade de chorar começou a ser mais que incômodo, tornou-se doloroso. Publicar a imagem de amigos abraçados e felizes, quando há poucos segundos antes dos cliques, os mesmos se olhavam com desprezo e raiva, de repente lhe passou a parecer extremamente de mal gosto... "Digitar kkkkkkkkk com uma lágrima descendo do lado esquerdo era clássico..." E os eternos bons dias on line, nos quais convidava todos a ser felizes, enquanto que ele nem lembrava mais o que era felicidade fora de fotos e vídeos e frases meticulosamente pensadas para timelines das redes sociais?

“Eu percebi que havia alguma coisa estranha... Fui lembrando da minha infância... Sim, havia alguma coisa estranha... Havia alguma coisa dentro de mim que não combinava com o que eu via fora...” E essa coisa, Francysgleusson descobriu de uma forma dolorosa e assustada, como acontece a muitos jovens, e pessoas mais maduras também: “Então, finalmente eu descobri, eu me assumi... Foi difícil, não foi fácil... Eu vi exatamente o que eu era, sem culpa nem medo, I am what I am...”

“Isso mesmo, eu não podia esconder isso pra sempre, não tinha como viver encubado, dentro de uma armário feito de fotos e postagens perfeitas online e caras e bocas ultrafelizes em público: eu era o que eu era: um ser humano!” 



- Foi nesse momento então que você se deu conta de que você tinha certas necessidades...?

- Sim. Percebi que querer conversar sinceramente com alguém, olhando nos olhos, não era uma coisa pervertida... Era normal! Antes, pensava que dizer pra alguém que tinha errado e que me sentia mal por isso, correspondia a se declarar um doente, um psicopata, um looser... Mas depois vi que apenas personagens de filmes e heróis de seriados americanos são ao mesmo tempo felizes, bonitos, infalíveis, conhecedores de todas as grandes cidades do mundo, leitores de todas as grandes obras, e etc... Realizei que não saber a resposta pra uma pergunta é algo que acontece a todo mundo... Sentir saudade – essa safadeza – é algo que ocorre todo dia... Até mesmo gostar mais de alguém do que esse alguém de você – isso é humano!

- São descobertas perturbadoras... Como você lidou com isso, com essa descoberta de que no fundo, você era um ser humano e não um personagem de novela ou de seriado americano?

- Saí do armário aos poucos, sabe? No começo foi difícil, porque demonstrar a sua humanidade aos outros ainda causa surpresa e medo: as pessoas têm medo do que não conhecem. Então quando te veem dizendo alguma coisa num tom de voz sincero, ou admitindo um erro, ou elogiando uma pessoa que todos consideram ser um inimigo seu, elas te olham esquisito, como se você estivesse vestindo um modelito verde limão...

- E hoje, como é a sua vida fora do armário da vida perfeita?


- Hoje eu tenho amigos que compartilham comigo a sua condição de seres humanos. Conversamos, saímos juntos, nos apoiamos – isso é muito importante. Somos xingados nas redes sociais, mas aprendemos muito com nosso ato de coragem de sermos quem somos, sabe? Ser diferente é difícil na nossa sociedade... mas vale a pena ser você...

- Então você teria um recado para aquelas pessoas que vivem os momentos infelizes que você viveu por não assumirem sua condição, por não quererem ser o que são de fato?

- Sim, sim: olha, pessoal, eu sei que não é fácil. Ser perfeito, bonito e feliz 24 horas é a ordem do dia. A sociedade não sabe lidar com o que diverge do que se considera “normal” – e o que é normal? Normal é ser popular, ser sempre bem humorado online, ser forte e intocável no dia a dia... Isso é o que exigem de todos nós. Mas você, que vive sua vida de personagem de filme e novela, com certeza sente que tem alguma coisa errada... e é porque tem... Tem um provérbio chinês, sabe, que diz que ver uma bailarina é a coisa mais linda que existe – mas ela treina, treina pra conseguir encantar a todos – porém ninguém consegue viver 24 horas nas pontas dos pés, ninguém consegue andar o dia todo com um salto alto... Não é humano! Simplesmente não é! Então, a mesma coisa com pessoas como eu: você não é uma foto de perfil, você não é um dos amigos do Friends ou dos deseperados do ThE Walkind Dead... Você é um ser humano, cara! Não tem script pra tua vida, não tem ângulo certo pra cÂmera existencial da vida que te filma todo tempo! Você é um ser humano! Um homem ou uma mulher (ou homem-mulher, etc) de verdade! Então, tenha força, vença suas barreiras, vença os obstáculos – sai do armário! Be happy!


Agradecemos ao Francysgleusson pela entrevista e por compartilhar sua história de superação ao assumir a falibilidade e incompletude essencialmente humanas. Lembrando que dentro de duas semanas, acontece na cidade a primeira Parada do Orgulho Humano. Várias celebridades assumidamente humanas, como o Dalai Lama, Leonardo Boff e Nietzsche, confirmaram presença. Espera-se que o evento reúna número maior de participantes, blá blá blá blá blá...

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Animais versus pessoas

Pra começo de conversa, a oposição evocada no título é falsa, em vários sentidos. Pit bulls não são inimigos dos seres humanos, assim como hienas, cobras, escorpiões, etc. Muita gente não sabe, mas não existem casos em que uma espécie animal, do nada, decide atacar seres humanos a fim de destruí-los (enquanto que o contrário é quase regra). Nem os lobos faziam isso nos nossos tempos das cavernas – porque tinham algo como uma “consciência instintiva” de que se comessem todos os macacos semi-pelados de uma vez, não teriam comida mais tarde. Preciso lembrar que nesse aspecto, seres humanos ainda não aprenderam muito com os ancestrais dos nossos beagles, pitbulls e poodles toy?

Cães e gatos sempre estão mais ou menos em evidência. No facebook da vida, a coisa que você mais vê são pessoas mais sensíveis às agruras da existência animal mamífera não-humana e não-selvagem, divulgando seus sentimentos, muitas vezes nobres, em relação a esses seres. O drama e a legitimidade de cada manifestação virtual variam, assim como varia o grau de simpatia que tais manifestações vêm causar.


A questão é: animais não-humanos devem ser tratados como humanos?

Depende de como se veem esses seres.

Primeiro, porque eles deveriam se tratados como humanos?

1 –Eles existem – sim, existem, estão aí, e como seres inevitavelmente irmanados ao Homo sapiens sapiens (pois todos decendemos da mesma célula inical, bilhões de anos atrás), tÊm direito à vida;

2 – Eles sentem (e talvez seja o mais importante). Só quem nunca “teve” ou educou um cachorro ou um gato ousará dizer que eles não têm “alma”, que eles não se angustiam, não se alegram, não fingem, não têm medo nem orgulho. À parte às projeções e antromorfizações (que tambéme existem, inclusive de seres humanos para seres humanos), até o ano de 2004, Ludwig van Beethoven Caninus Araújo Bezerra era um membro da família Araújo Bezerra, da qual eu também faço parte, e não há como rebaixá-lo ao status de urso de pelúcia animado ou coisa do tipo.

3 – Nós somos responsáveis por eles – e aqui falo em primeiro lugar dos animais domésticos ou domesticáveis, e em segundo, dos selvagens. Os primeiros, por razões óbvias, dependem de nós e devemos ou deveríamos nos sentir obrigados a cuidar deles da melhor maneira possível. Os segundos, nós, como – aparentemente – espécie “dominante” (juro que poria muitas aspas nessa expressão...), por possuirmos capacidades ("conscientes"...) como previsão, planejamento e modificação, deveríamos proteger e conhecer, a fim de nos integrarmos de forma equilibrada ao resto da fauna do planeta, da qual somos parte.


Segundo, porque eles não deveriam ser tatados como humanos?

1 – Eles não são humanos. Não vou dizer que acho que todo ser humano vale mais que um cão ou que um gato – não acredito nisso. Também não vou dizer que o sofrimento humano é mais digno de atenção do que o de um golfinho ou de um hamster. Mas vou dizer o seguinte: o doloroso momento da escolha entre um e outro, entre a vida de um beagle, digamos, e de uma criança, não pode ser escondido ou mascarado atrás de um imperativo ou lei divina que afirme que seres humanos são inferiores aos não-humanos – e vice-versa...

2 – Você é um ser humano. A não ser que em algum laboratório perdido no mundo, um golfinho ou bonobo tenha aprendido a interagir com humanos por meio da linguagem escrita de uma forma extraordinariamente efetiva, você, que está lendo isso aqui, pertence à mesma espécie animal a que pertenço, logo, é de se esperar que compartilhemos o mínimo de experiências existenciais: choramos, rimos, gozamos, magoamos, de forma muito parecida, mais parecida entre nós do que entre você e um gambá, por exemplo. Por mais que alguns digam preferir bicho a gente (e não “bicho do que gente”), a ideia de que se entende a mente de um animal como se fosse o próprio, tem mais a ver com uma sensibilidade emocional privilegiada do que com uma “realidade objetiva” de como o mundo funciona. Que uma pessoa tenha traumas com seres humanos é algo perfeitamente compreensível e normal. E que essa pessoa projete em um periquito ou tartaruga esperanças de cura e amor incondicional, também é compreensível. Cães realmente amam pessoas, eles olham nos seus olhos e sabem, eles veem – isso é indescritível. Mas seres humanos também fazem isso! Gatos não amarram bombas na cintura nem queimam outros gatos em fogueiras; tartarugas não arrancam orelhas umas das outras (e nem é porque elas não tem orelhas...)... Mas golfinhos não arrecadam alimentos para ajudar pessoas em região de guerra (nota: talvez eles o façam, são animais talvez tão ou mais inteligente do que os seres humanos – mas eles não podem fazer como nós fazemos). Cachorros não constroem hospitais para cuidar de crianças com câncer...

Então, tipo, seres humanos podem ser legais. Merecem ser tratados, no mínimo, como animais – ou seja, com respeito e dignidade.


Pra resumir um pouco:

Não vou chamar ninguém de hipócrita – é uma palavra feia e que deve ser usada só pra quem merece, ou seja, quem é conscientemente hipócrita. Beagles presos em laboratórios para testes científicos de quaisquer tipos não é uma coisa digna de seres humanos inteligentes. Os ativistas que os liberaram merecem aplausos. Havia dor ali onde esses seres eram mantidos, e dor gratuita, onde quer que ela ocorra, não deve ser admitida se se pode e se deve evitá-la.

Porém, aqui vem meu reflexivo e humilde MAS: uma pessoa que derrama lágrimas por um gato, que vocifera e briga pelos direitos dos animais não-humanos, mas que não demonstra o mesmo grau de sensibilidade diante de um hospital lotado ou de uma pessoa doente, ou de um desconhecido chorando inconsolado na rua... Essa pessoa merece certos momentos de reflexão da nossa parte. Porque é mais fácil invadir um laboratório e libertar cães do que reagir, de alguma forma, ao sofrimento humano que todos os dias se vê na televisão?...

Não estou dizendo que as duas “lutas” se opõem – o mais normal é que a mesma pessoa que cuida de animais cuide também de humanos... Mas isso nem sempre é verdade. É no mínimo desconcertante assistir ao martírio de uma pessoa que defende animais não-humanos e que demonstra impiedade com seus colegas de trabalho, amigos e parentes...


Pra finalizar mesmo: animais são como seres humanos: são seres vivos que têm necessidades fisiológicas, emocionais e psicológicas como nós, embora não da mesma forma nem da mesma natureza. Mas um cachorro não é uma criança, e um adolescente em “situação de risco” não é um rato, nem um poodle. Dogmatismos só fazem mal, só atrapalham as discussões, em qualquer área. Salvar cães, gatos, ratos, coelhos é algo nobre e que não deve parar. As reticências quanto a vacas, galinhas e bodes deveriam ser repensadas e discutidas (amor e respeito seletivo também é algo comum a animais humanos e não-humanos...). Amar aos animais sem amar ao próximo... Isso é possível? Isso é humano? (sem violinos, por favor)


terça-feira, 8 de outubro de 2013

As bactérias que são você

Não, apesar do título, esse não é um mais um post em que solto aquelas críticas ácidas contra a humanidade que se ilude achando que podemos viver felizes para sempre enquanto que exterminamos plantas e animais, e poluímos terra, ar e água como loucos de pedra que saem defecando pela casa toda, sorridentemente.

Também não vou falar de doença. No senso comum, falar de bactéria é falar de doença. Falar de bactéria é falar de sujeira, e, portanto, de desinfetante ou de antibiótico.

Queria falar de quem somos e de quem achamos que somos.

Desde criança a gente se acostuma a pensar que cada um de nós é uma espécie de exemplar maravilhoso de uma espécie animal evoluída e superior a todas as outras: quem nunca ouviu em um documentário qualquer, cientistas se referirem a seres humanos como o produto de uma evolução contínua que começou com vermes nadando no oceano, passando por lagartos e macacos,  e hominídeos obtusos e feiosos? É uma visão atraente pra muita gente: parece que esse é um dos poucos pontos em que religiosos e cientistas fundamentalistas concordam pacificamente: nós mandamos, we run the world, nós somos o suprassumo da natureza ou da criação...

Pra quem acredita (e no fundo, no fundo, pra quem não acredita tb...), Darwin foi um dos que baixaram a nossa bola. Antes dele, claro, houve Copérnico. Não éramos nem mais o centro do universo e nem o da natureza. Muitos põem na lista aquele senhor chamado Freud – mas como foi ele mesmo que tomou o lugar pra si, vou deixá-lo nadando em seu narcisismo e pular mais pra frente: pras nossas amigas bactérias.

É isso mesmo: amigas. Há muito tempo vc deve saber que dentro da sua barriga existe algo chamado flora intestinal. Deve saber que se essa flora for perturbada – durante uma infecção intestinal, por exemplo – as coisas desandam e ficam odorífica e dolorosamente desagradáveis... E apesar de “flora” nos fazer pensar em flores e borboletas coloridas voando dentro da nossa barriga, a verdade é que se tratam mesmo é de bactérias – esses bichinhos minúsculos que, simplesmente, estão por toda parte... e não há bactericida capaz de eliminá-las.

E quando digo em toda parte, é em todo canto mesmo: no ar, na terra, nos mares, no fogo... e não é só poesia: existem bactérias que vivem na estratosfera; existem outras que habitam no solo, responsáveis pela sua fertilização; e tem até bactéria no fundo do mar, no fundo mesmo, onde a luz do sol nunca chega, onde tudo é um breu eterno... e onde quem sustenta a vida de todos os outros animais são exatamente as bactérias.

“Sim, ok. Então o planeta é um lugar sujo e cheio de bactérias. Nós, seres humanos só evoluímos porque nos tornamos limpinhos...”. Não.

pesquisas mostrando que, na verdade, na verdade, as bactérias, pra todo lugar que se olhe, em toda espécie animal e vegetal que se considere, estão lá, lindas – não causando doenças e atrapalhando a vida – mas justamente o contrário, ajudando-a a se sustentar... Aliás, o correto nem é dizer “ajudar”, mas sustentar – sim, sem bactéria, não ha vida.

Cálculos simplórios dizem que a massa de bactérias no mundo (na solo, nas cidades, nas plantas, no ar) é da ordem de toneladas e toneladas. Se contarmos os oceanos, que cobrem 70% da superfície da Terra, a infinitude de toneladas se multiplica pra números que não podemos conceber...

Mas e daí? Ok, mesmo supondo que nascer, viver e morrer num mundo de bactérias não signifique nada pra vc (afinal de contas, o que o olho não vê, o coração não sente...), ainda tem a outra parte d ahistória – e voltemos às flores e borboletas da flora intestinal:

Descobriu-se, mais recentemente, que o número de bactérias no corpo humano passa dos bilhões, sendo que há quem diga que chega aos trilhões. Só pra ficar claro: isso é muito mais, umas dez vezes mais, do que o número de células do corpo. É mais ou menos assim: existe mais DNA de bactéria no seu corpo do que DNA humano. Não é legal? Aí vc pensa (espero que não pense, na verdade): “djabeh isso? Vou ter que tomar um coquetel de todos os antibióticos existentes pra matar tudo isso que me devora por dentro?” A resposta negativa é óbvia, mas não apenas pela flora intestinal – mas por causa do corpo todo...

Ainda não se sabe direito como, mas TODAS as bactérias presentes no corpo humano estão lá porque são necessárias: na boca, na pele, no estômago, no sangue, no cérebro... Cada uma tem uma função, e estão lá desde que nos entendemos por coisas vivas. Elas estão dentro até das nossas células: as mitocôndrias, que são, digamos, a central de energia de cada uma das bilhões de células do nosso corpo, se originam de bactérias, que, num passado remotíssimo, foram aprisionadas dentro das células... tanto é que têm DNA próprio...

Mas ainda tem gente que vai dizer: “E daí?”

E daí que por causa da importância do papel desse verdadeiro ecossistema dentro de cada um de nós, tem-se perguntado até que ponto as bactérias são responsáveis pelo que sentimos, e, portanto, pelo que somos... Certamente, vc já ouviu falar que “vc é aquilo que come” (na minha opinião, isso é um insulto pra quem come McDonalds lambendo os beiços... mas enfim). Também deve ter ouvido falar que isso faz todo o sentido: o excesso e/ou a ausência de certas vitaminas, sais minerias e outros elementos no organismo pode causar alterações de humor e, a longo prazo, de personalidade: alegria demais, depressão, irritação ou bem estar – ou seja, o que vc é depende MESMO do que vc come. Pois bem, descobriram-se algumas coisas mais:

Primeiro: que as bactérias da nossa colorida flora intestinal são diferentes em diferentes tipos de pessoas. E são diferentes de forma parecida como os tipos sanguíneos são diferentes. E essas diferenças dizem respeito à forma como o corpo digere e absorve os nutrientes da comida que comemos: estaria aí uma explicação de porque algumas pessoas comemo que querem e não engordam nunca; e porque outras pessoas têm que se torturar pra não engordar. Também estaria aí a explicação de porque algumas pessoas vivem tendo problema de intestino, ou problemas de pele, ou de sangue, etc. Parece exagero, mas de certa forma, tudo tem a ver com esse segundo EU que vive dentro de cada um de nós: bactérias...

Segundo: já se sabia que, depois do cérebro, a região do estômago e dos intestinos é a que mais libera neurotransmissores e hormônios na corrente sanguínea... Não é à toa que algumas emoções estão relacionadas à barriga – simplesmente não é só o cérebro quem manda no que vc sente, o intestino também!
E aí vem a parte de ficção científica: e nosso intestino tá cheio de quê? Isso: de bactérias. E adivinha o que se têm descoberto? Que elas também liberam neurotransmissores, ou seja: elas sabem falar a língua dos neurônios e das outras células do corpo. Uau, né?

Só pra não me alongar mais – e pra que é que serve isso tudo? Por que é que uma pessoa que vive para a Linguística, se interessa por bactérias e sua fantástica ubiquidade?

Primeiro porque sou curioso mesmo. Depois, pq acho interessante incluir na sequência de figuras que foram trazendo o ser humano ao seu devido lugar no Universo, Copérnico, Darwin e as bactérias.

Segundo, pq é fascinante pensar que não somos apenas o que pensamos que somos – que além de sermos essas pessoas funcionais e senhoras de si no dia-a-dia, somos um universo ambulante feito de seres que, em geral, desprezamos...

Terceiro: pensar que muitas das mazelas que nos atingem enquanto seres vivos podem estar relacionadas à nossa ignorância ou desrespeito ao modo como funcionamos, ou seja, como ambiente para outros seres vivos, é algo que pode ser considerado, no mínimo, de vital importância...

E por último, é poético e bonito nos vermos como miniatura do que o nosso planeta é: a moradia de várias espécies que, para conservar  a vida, devem viver em equilíbrio e em paz...

Aleluia!

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Pessoas, carros, viadutos e, de novo, jumentos


Pessoas

Seres humanos, essa interessante espécie animal da qual (orgulhosa e vergonhosamente) faço parte. Sabe-se que existem milhares de espécies de insetos no planeta, de todos os tipos, cores, índoles e tamanhos – me pergunto se a variedade entre pessoas do mundo todo é maior ou menor... ou alguém duvida que existam pessoas-barata, pessoas-borboleta, pessoas-formiga, cupim, louva-deus, esperança, cigarra, gafanhoto...?
Adoro usar a natureza como fonte de comparações e metáforas. Tem um inseto por exemplo, uma espécie de vespa – que acho até que serviu de inspiração pro filme Alien – que simplesmente pôe seus ovos no interior do corpo de uma lagarta viva. Alguns dias depois, os ovos eclodem, e as larvinhas de vespa se alimentam da lagarta, devorando-a de dentro pra fora – viva da silva... Pelo menos até que a prole saia e virem novas vespinhas simpáticas e aliens...

Já compararam nossas sociedades humanas com formigas, até eu já escrevi umas coisinhas sobre isso. Devo ter falado tb sobre como essa comparação é inadequada: pois formigas trabalham para que as formigas, todas as formigas, vivam – aquela coisa meio “comunista” de “o importante é o formigueiro”... Bem, mas elas vivem. Não me sentiria muito bem se os nossos governantes nos vissem como formigas – que devem trabalhar pelo “bem comum” (que bem comum?), abandonando a sua individualidade e coisa e tal. Mas também não me apetece muito que nossos governantes se comportem como parasitas, verdadeiras lombrigas solitárias (não são mais insetos, mas tudo bem), nos devorando por dentro, se alimentando vorazmente dos 37% de impostos que pagamos no feijão ou na farinha... e transformando isso tudo, por meio de processos cínicos – a corrupciossíntese – em caviar e lagosta...

Se chá de alho ou os remédios anuais (leia direito!) pra verme não estão resolvendo muito, que tal tentarmos a lendária pílula do mato: dizem que – no caso de cães – ou ela cura o bicho ou mata de vez... Mas as madames vão gritar loucas: pra que mexer nas estruturas de tudo? Pra que mudar hábitos administrativos e corporativos que vêm desde as sesmarias? O ditado que vale nesta cidade e neste país, nesse momento é: é mais lucrativo remediar do que prevenir.


Carros

Será que mister Ford suspeitava que um dia suas máquinas de transporte pesadas e poluidoras um dia se tornariam mais importantes do que seres humanos? Não vou dizer que duvido, porque não sei. Também não vou dizer que meu sonho secreto é destruir todo e cada um dos automóveis que circulam no planeta. A nossa civilização do jeito que é hoje precisa de velocidade, precisa se locomover: #fato (pra usar essa irritante hashtag adolescente). Mas ousaria dizer que quando ele teve a ideia de produzir máquinas de transporte em série, pensava, além de no lucro, na função da coisa: ir de um lugar ao outro mais rápido, mais comodamente. Em 1900 e pouco, preocupações sobre meio ambiente e mobilidade urbana pareciam sem sentido. Pois muito bem: benvindo à Fortaleza do século XXI: praia, sol, asfalto, ruas estreitas, carros e carros e carros... E na sequência vêm: stress, brigas no trânsito, acidentes, poluição, barulho e, claro, feiura – sim, não sei qual é a beleza de ver sob o sol escaldante uma fila infinita de carros fritando e abarrotando a cidade...

Os mais otimistas e amantes de carros e de gasolina se concentrarão num dos elementos da sequência anterior: estradas, ruas, avenidas – ou antes, na falta delas. O problema é esse, dirão: a falta de novas ruas e avenidas e, claro, viadutos. Aí novamente entram as comparações biologizantes: todo mundo sabe que pra qualquer espécie parasita, quanto mais hospedeiro, mas parasita, ou seja: quanto mais estrada, mais carro,  já que o sonho tão bem cultivado pela tia Publicidade nas emergentes classes C e E é ter um carro, qualquer carro, qualquer preço, mesmo que não seja necessário. Em Fortaleza são mais de cem novos carros por dia injetados nas ruas da cidade, a maioria levando uma ou duas pessoas, em distâncias menores que alguns quilômetros... É preciso ser um gênio pra sacar que esse esquema não tem futuro?

Não tenho nada contra carros. Na verdade, eu os amo nos fins de semana, e recentemente descobri que em viagens, é uma dádiva – e não os trocaria pelos cavalos ou pelas carroças que predominaram até menos de um século atrás, transportando as pessoas a menos de 50 km por hora.

Mas eu amo bicicletas. Vou surpreender alguém se disser que em muitos percursos longos e congestionados da cidadade ando mais rápido do que o trânsito cheio de atrasados e estressados? E numa sociedade de gordos e inertes, onde se paga uma fortuna pra pedalar na frente de uma televisão, e onde sempre se reclama de stress e de falta do que fazer, a bicicleta me faz, no fim de uma boa volta, me sentir pronto pra tudo. Mas a apologia à bike deixo pra outor post. Falemos de viadutos.


Viadutos

É claro que há uma questão estética e cultural no meio das discussões sobre o Cocó e sobre o nosso querido viaduto: se eu digo “progresso”, vc pensa em duas pessoas sorridentes andando de bicicleta ou em carros velozes cruzando um viaduto? Normal, é isso que vemos em todo lugar, num tipo mórbido e meio inconsciente de “propaganda urbanística”: todos devemos ser como São Paulo: cinzenta, cheia de gente e de viadutos... Ousaria chutar que deve existir doido que curte um engarrafementozinho no fim de tarde: que prazer impagável, hein, curtir um som no ar condicionado enquanto que os peões passam suados do lado de fora, voltando do trabalho? Pois bem, aproveitemos essa imagem e pensemos: como se discute bem estar no trÂnsito, mobilidade social, humanização da cidade, com uma pessoa que tenha uma mentalidade dessas? Uma pessoa que vê o cinza e o concreto como modelo de beleza urbana? Os princípios que cada um dos representantes dos lados da discussão sustenta são, a priori, diferentes: um quer a diferença, a distância, o exclusivo, o caro, a divisão; o outro pensa mais em todos vivendo saudáveis num espaço urbano que não deixe de ser humano. Não estou falando de anjos tocando harpas debaixo de árvores na Praça do Ferreira: só estou falando em lembrar que: CIDADES SÃO FEITAS POR SERES HUMANOS, logo (por favor, corrijam se eu estiver errado), essa p*rra de cidade também deveria ser feita PARA seres humanos. Carros são objetos, meios, máquinas – os habitantes de Fortaleza são os fortalezenses, nós respiramos oxigênio e não CO2; nós temos pernas e não rodas nos pés.

Pois bem, viadutos. Não sou engenheiro, nem administrador de empresas – mas tenho cérebro e vejo coisas e acho que aprendi a pensar ao longo de trÊs décadas, então digo o seguinte:

Quando se quer fazer alguma coisa, dá pra fazer. “Não dá pra fazer um túnel perto do Rio Cocó porque tudo alaga”. Já fizeram um túnel debaixo de um mar. “Mas vai ter que desapropriar dois prédios”. Desapropriaram muito mais do que isso, e de maneira não tão simpática.. ah, mas era na periferia! “Mas ninguém vai querer andar de bicicleta porque o sol é muito quente”. Em Amsterdam senhoras de 80 anos andam de bicicleta, executivos vão ao trabalho de bike, famílias andam de bike juntas – e ninguém morre; a cidade é silenciosa, o ar é bom de respirar, tem árvore até dar uma dor. “E o sol... tá pôdi?” Existe um tipo de máquina natural que tem a mágica capacidade de transformar água, gás carbônico, minerais e luz em oxigênio, e tudo isso de graça e sobretudo, dando de bônus uma cobertura verde muito bonita que produz sombras que já salvaram vidas, inclusive às daqueles que jogaram spray de pimenta na cara de cidadãos descontentes uns dias atrás... Ah, mas claro, plantar árvores ao lado de ciclovias é uma coisa mágica, que necessita de enoooooormes investimentos, muito maiores do que aqueles investidos ao longo dos 20 ANOS que foram gastos pra construir UMA LINHA do metrô de Fortaleza...

Mas como convencer o seu Zé ou o estudante de medicina Francysgleysson a abandonarem seus carros e andar de bike? Publicidade: ou como vc acha que nos fazem comprar aparelhos celulares caros, roupas de marca e outros objetos cujo uso real que fazemos no dia a dia não justifica a compra? Em Amsterdam o processo durou décadas. “Mas Fortaleza não é Amsterdam”. Isso é bem verdade: mas cadê o nosso jeitinho brasileiro? A gente num adora furar fila pra chegar na frente primeiro? Pq não aproveitar essa tendência  a querer se dar bem e pular a fase da cidade totalmente parada no trânsito, do dinheiro gasto em viadutos e  obras faraônicas superfaturadas, dos rodízios irritantes e etc, enfim, e passar logo pra fase onde Fortaleza é uma cidade cheia de sol e mar e árvores, onde só anda de carro quem realmente precisa ir pra longe... onde quem pensa direito prefere economizar 1000 reais de gasolina por mês se mantendo em forma de graça numa bike?

Uma sugestão de resposta vem a seguir.


Jumentos

Talvez hoje Jesus tivesse nascido dentro de um carro, já que pro recenseamento obrigatório em Belém certamente as rodovias e viadutos estariam cheios de carros... Isso se Maria não morresse num acidente devido a um motorista bêbado ou outro agressivo saindo do carro com uma chave de fenda na mão...

Já falei antes e repito: jumentos são criaturas formidáveis, inteligentes para o que existem: viver como jumentos. Nós os escravizamos pra turbinar a nossa civilização, e agora, atribuir-lhes a “vergonha” de serem burros, no sentido de imprestáveis, estúpidos, etc, é simplesmente... burro: montamos literalmente nos coitados durante séculos (e ainda hoje, of course) e cuspimos no lombo que nos susteve?

Mas dobrando-me À força da linguagem e do hábito: sabe porque seu Zé não vai abadonar seu carro recém comprado, nem o Carlos Eduardo Francyscgleysson nunca que vai vender o carro que ganhou do pai, nem os funcionários da prefeitura vão parar de “protestar” a favor da construção de um viaduto em cima do que deveria ser uma reserva ambiental?

Sabe porque vamos aumentar a temperatura média da cidade trocando terra por asfalto, erguendo torres e estradas de concreto, derrubando árvores em vez de plantar, aplaudindo o cinza do sul enquanto temos esse verde-azul lindo do mar gritando pra sermos mais legais e felizes e naturais?

Sabe porque? Porque, como dizem as ceguinhas de Campina Grande, “a pessoa é para o que nasce”, e nem para sermos jumentos (comendo capim e carregando salvadores nos lombos) nascemos.

E mais uma vez, me rendendo às nossas expressões regionais (eloquentes de um jeito que chega a emocionar), digo: “Queima, quengaral!!! Pega fogo cabaré!” Bora asfaltar logo o Aterro da Praia de Iracema todo! Dava um estacionamento só a massa, ó! E prefeito, faz a mesma coisa com o Cocó todo! OS frequentadores do Iguatemi agradecem... mas não agradecem mais do que as construtoras e os eternos bastardos do Estado, que não largam essas tetas fartas de jeito nenhum!

#ViadutoSim

#JumentosSim

sexta-feira, 5 de julho de 2013

"O seu Zé usa papel higiênico dupla face, câmbio!"

Um belo dia, 17 anos atrás, fui interpelado pela minha mãe a fim de dar esclarecimentos sobre o conteúdo secreto de um diário que analítico-romanticamente escrevia na época (até hoje na verdade)... Claro que o tom foi de conversa familiar e não de Gestapo ou FBI, mas certamente os sentimentos não foram de alegria e bem estar. Na verdade, me senti ultrajado, apesar de ter sido criado para contar tudo aos pais (diferente de hoje, em que adolescentes se transformam em reis tiranos de suas famílias...). 

A sorte é que, tendo lido na Superinteressante (argh) que Leonardo Da Vinci escrevia da direita à esquerda, o que exigia um espelho para que se lesse seus escritos, resolvera imitá-lo, e essa criptografia primitiva me poupou de mais ultraje e níveis mais elevados de constrangimento...

A questão é que, apesar de não constar nas linhas do meu diário a contabilidade dos lucros com guerras sujas e desnecessárias, os conchavos imundos para derrubar presidentes ou negociar áreas de pré-sal com candidatos de direita à presidência de países americanos, e coisas do tipo, me senti muito mal e atacado nos meus direitos...

Mas não é bem de Julian Assange e de Edward Snowden e sua relação com os EUA e a Europa que queria falar, mas sim sobre o que este último revelou de forma límpida e bombástica a quem interessar possa: nós somos vigiados o tempo todo, em tempo real, online. E por quem? Por um Estado. É a paranoia-pesadelo Big Brother confirmada em alto e bom som. Teorias da conspiração já gritavam isso tudo - mas o carimbo de true story baseado na revelação da existência do Prism, dá o que pensar...

Pensar o quê? Há quem pense dois segundos e conclua que "tudo bem, não tenho nada a esconder". Certo, nem eu... Em tese. Em que pode me prejudicar saber que, além das corporações online (que por meio de entrecruzamento de dados conhecem quase tudo sobre a sua, a minha e as nossas pessoas), agora governos estão cientes dos livros e aplicativos que comprei mês passado? Aparentemente, nada. Mas e se além disso, fico sabendo que eles acompanham cada um dos meus posts e das minhas mensagens privadas, e os dos meus amigos também, sobre temas como "revolução no Brasil", "ditadura capitalista americana", etc... Mais uma vez, a resposta pode ser "Nada demais". Mas pensemos mais alguns segundos: o segredo da informação não é a própria, enquanto unidade em si, mas os cruzamentos, as combinações que se fazem. Lembrem do Google Earth: muito legal vc poder visitar cidades do mundo todo na tela do computador, do celular, do tablet, etc. Mas raciocinemos: se uma empresa como a Google disponibiliza, para meros cidadãos como vc e eu, o mundo todo numa resolução cada vez maior, imagine o que Obama não deve poder visualizar no seu Macbook ou iPad na White House? E tem mais: uma ou duas vezes por mês saem notícias sobre nanorobôs do tamanho de insetos encontrados por participantes de manifestações pelo mundo, microfones descobertos em embaixadas, novas tecnologias que permitem ter acesso a tudo e a todos em todo lugar, a qualquer minuto...

Há um mês, isso tudo seria pura teoria da conspiração, mas agora, depois do Prism, é, no mínimo bom senso e lógico acreditar que nesse exato minuto vc pode estar sendo observado - visualmente e virtualmente - , nem que seja por acaso, por um técnico (humano ou não) de algum ponto do solo americano...

Esse pensamento não me agrada de jeito nenhum. Uma coisa é vc ir ao shopping e saber que um segurança pode estar dando o zoom na bunda da sua amiga ou se divertindo com o corte de cabelo de alguém. Outra coisa é saber que um país que não hesita muito em atacar nações ideológica e fisicamente por pura ambição, está monitorando cada palavra que vc digite ou fale... E isso com a anuência de empresas a quem vc confia simplesmente boa parte da sua vida, como Google e Facebook.

As implicações políticas, psicológicas, sociais da revelação desse Big Brother mundial e cínico vão além do alcance da minha capacidade de reflexão. O que posso dizer é que isso não é certo. Não é certo um país ter tanto poder sobre todos os outros; não é certo um país saber tanto sobre todo mundo. Por enquanto os EUA são uma ditadura capitalista light - mas e se der a louca e eles decidirem, assim, do nada, que vão deixar de serem bonzinhos e começarem uma campanha publicitária muito bem articulada (já que possuem um volume de informações infinito sobre o nosso país) em que o Brasil seja apresentado como um perigo para a ordem mundial e esteja desenvolvendo armas nucleares e etc? Quem poderá nos defender? O Chapolin? 

Ok, nível de paranoia acendeu o sinal amarelo... mas não sem base empírica, que fique claro.

Para fechar a cadeia de ideias do post:

Há um livro do gênio, mestre, magnânimo autor de ficção científica, Arthur C. Clarke, chamado, em inglês, The Light of Other Days. Super resumidamente, conta-se a história de uma máquina, criada num futuro distante, que permite a visualização do que aconteceu em qualquer lugar, em qualquer momento do passado. De início, tal máquina é utilizada apenas por governos e universidades com fins científicos e bélicos, claro. Mas como aconteceu com a internet, a visão capitalista do inventor da máquina, um homem inescrupuloso do universo da mídia, transforma o aparelho em algo popular, e, depois de alguns anos, qualquer cidadão passa a ter acesso ao dispositivo de visualização do passado. As consequências são inúmeras e profundamente sísmicas: imagine vc poder assistir a traições, crimes, mortes, cenas de sexo, de alegria, etc, etc, etc, tudo numa tela, tudo exatamente como aconteceu - o passado como de fato foi diante de seus olhos. Ou seja, não há mais possibilidade de existir mentira, não adianta mais pensar em enganar ou ocultar fatos - mais cedo ou mais tarde tudo o que se está fazendo no presente será visualizado,  num futuro próximo ou distante, por um observador onipresente... Para se ter uma ideia das transformações que ocorrem nas sociedades humanas, aconselho vivamente a leitura desse livro. Como todas as histórias de Clarke, ela é muito bem contada e a cada página vc se assombra diante do brilhantismo e da inventividade do autor.

Conectando o enredo do história acima com o enredo da história do agora, a diferença básica que se sobressai é que no livro de Clarke, todos sabem de tudo - o que configura um tipo de democracia hiperbólica do conhecimento, ou antes, uma tirania espaço-temporal da informação... No nosso hoje, ocorre outra coisa: alguns governos sabem demais da vida de quase todos, e dado que sabemos muito pouco ou quase nada do que realmente pretendem esses defensores da paz e da liberdade, é muitíssimo adequado pensar que vivemos numa das piores ditaduras da história - tão bem aplicada e manejada, tão bem articulada e abafada por narcóticos culturais (Hollywood, Apple, Samsung, Chrysler...) que nós mal nos apercebemos dela...

Viva la revolución!

Viva la paranoia!


quinta-feira, 13 de junho de 2013

Sobre cidades apavoradas, atrizes com medo e civilizações burras


O primeiro assalto que sofri foi aos 13 anos. Minhas riquezas, num tempo em que celular era coisa de executivo ainda, resumiam-se a alguns reais no bolso. Houve quem reprovou a minha falta de reação na hora. Pois muito bem: o último foi com uma arma prateada na barriga e o prejuízo foi certamente maior. Hoje não se exige mais reação – nem da vítima e até certo ponto nem da polícia.

Vou falar aqui enquanto cidadão de Fortaleza e do Brasil. Existe um medo que se sente no ar, é quase palpável, é visível nos olhos das pessoas na rua, onde qualquer gesto menos suave – os passos de uma pessoa correndo apressada, o barulho de uma motocicleta que se aproxima, um modo de se vestir mais descuidado – e o coração já aumenta estrategicamente o número de batimentos. A vontade de fugir dispara várias vezes ao longo do dia, esteja vc a pé, dentro da sua bolha de metal de quatro rodas ou até mesmo parado, na sua casa ou no trabalho. A sensação de insegurança é absurda e patética, beira a paranoia e faz de todos nós ratinhos medrosos que se mordem uns aos outros ao menor sinal de fumaça no labirinto...

Sim, a situação é crítica, os tempos são de sangue, de barbárie, etc. Mesmo descontando o exagero da mídia que insiste em fazer crer que o mundo é dor e dor e dor, ainda sobram muitas provas de que já houve sim outros tempos em que morrer por um objeto era algo muito menos possível de acontecer.

Pois vamos procurar um culpado para o apocalipse? Pois sim. Dependendo de com quem vc converse, as respostas vão variar das fáceis e óbvias às mais ponderadas e até esquisitas. Segundo os nossos telejoranais – que são conhecidos, claro, por sua imparcialidade essencial – a culpa é daquelas pessoas pobres, que se escondem naqueles bairros feios, verdadeiras fábricas de criminosos... Me pergunto se um dia ainda vão fazer uma reportagem pra mostrar como os fetos que um dia vão virar bandidos e marginais já apresentam, dentro do útero, uma cor meio avermelhada e unhas e olhos crescidos, além de proto-chifres e a ponta de um rabo no cóccix?

Pois sim, essas pessoas que, do nada, enquanto refletem sobre a vida, sentados no banco da escola bem equipada, construída com um dinheiro que nunca foi roubado ou desviado, do nada, decidem, como quem escolhe uma profissão: “Vou virar ladrão. Acho que o mercado oferece boas oportunidades. Além de tudo, sempre foi o meu sonho, subtrair objetos alheios e ser preso – sim, vou ser ladrão!”

Vai dizer que vc nunca pensou em ser um serial killer? Mas claro, trabalhar e estudar pesou mais na balança...

Antes que me acusem de defender o diabo (ou deus), podem ter certeza que não penso com amor no senhor que roubou meu celular apontando uma arma de fogo na minha barriga. Nem ao rapaz que me puxou a mochila há sete anos e levou dinheiro e documentos, nem tenho extamente pena dos que assaltaram a minha amiga cinco vezes; nem rezo pelo rapaz que ameaçou minha irmã mais nova com uma faca na barriga; nem por aqueles que mataram pessoas mesmo depois de terem em mãos dinheiro, celulares e joias... NÃO.
Mas sinceramente, não esqueço que poucos seres humanos escolhem, de forma clara e consciente se tornar escória da sociedade. Não deixo de pensar que os melhores Jereissati, Gomes, Bezerra, Silva, etc, se criados numa pobreza extrema, sem acesso à educação e toda hora bombardeados por uma propaganda que grita que ele ou ela tem que ter o melhor celular, o melhor tênis, a melhor roupa, também não resisitiriam muito diante de convites a conquistar objetos por meios invalidados pelo sistema econômico (pelo menos para pessoas, já que para corporações e governos a ética e as leis são outras...).

Escolher a mera punição como solução é fácil e exige pouca inteligÊncia e pouco planejamento. Mas qualquer pai ou mãe sabe que punição não basta – punição sem educação é um tipo negativo de educação: vc cultiva o ódio e o rancor. Vide nossas penitenciárias: seres humanos amontoados, fermentando em porões sujos como um vinho envenenado que em breve vai ser liberado em forma de bandidos graudados em tudo aquilo que APAVORA a nossa cidade... Nossas peninteciárias punem – mas só punem – e mal – criam eternos odiadores de tudo o que não for crime...

Fortaleza está apavorada. Sim. Mas qual Fortaleza? Só o ingênuo rodeado de borboletas e luz do sol acha que Fortaleza só é uma. Há uma fortaleza periférica que vive há décadas apavorada – mas e daí? Era só aquele povo da favela mesmo... Mas agora não, agora sim é um absurdo – o povo da favela tá invadindo a Aldeota, um povo que rouba, que mata, que não trabalha... tá todo mundo APAVORADO! Pense logo, pense rápido: solução? Contratar mais policiais despreparados para matar o maior número possível de pessoas “marginais” – em outras palavras, jogar mais fogo nessa guerra entre Aldeota e favela. É como nos video games... A luta do Bem contra o Mal... enquanto que uma boa parte do dinheiro dos cidadãos (favelados e aldeotenses) é desviado e vai parar... adivinha em quais bolsos? Nos do povo do Bom Jardim, Autran Nunes, Barra do Ceará? Jura?


Eu respeito muito as emoções dos outros. Quem sou eu para ousar ir contra o medo e o horror e o ódio de uma mãe que perdeu um filho num assalto ou situação parecida. Não quero essa dor e me compadeço com todas as pessoas que sofreram esses reveses urbanos terríveis.

Mas a parte em que a mãe pega uma arma (via policial doido com síndrome de justiceiro) e sai matando “marginais” que não tiveram escola ou trabalho porque o marido dessa mãe ganhou um dinheiro por fora por meio de superfaturação em processos fraudulentos... Essa parte entra na contagem da marginalidade TAMBÉM.

Um sonho: ver as pessoas não-marginais e apavoradas protestarem contra alguns de seus parentes políticos, que nos roubam e desviam o dinheiro dos nossos impostos todo santo dia, e direta ou indiretamente são responsáveis por boa parte dessas mazelas que nos apavoram a todos e todas.

Outro sonho: poder sair de casa sem ter que correr olhando para o lado igual a um psicótico, com medo de ser assaltado ou morto, ou as duas coisas.


Viver numa cidade considerada das mais violentas do país é apavorante – mas viver numa guerra suja e de fachada entre cidadãos que se odeiam, enquanto políticos corruptos assistem a tudo como num estádio romano? É mais apavorante ainda.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Clipes estranhos #1

Eu gosto de clipes musicais estranhos. Não que duas pessoas de mãos dadas, um pôr do sol e um grupo de amigos dançando numa balada não tenha seu charme batido - mas de vez em quando ratos caminhando sobre corpos, cabeças de porco num prato e pedras vulcânicas dando as mãos impõem, pedem ou exigem que vc pare um pouco, sacuda sua cabeça cheia de mesmices e tente ver o que vc não tinha visto, ou que vc já tinha visto, de forma diferente.

E já vamos adiantando aqui que estamos super conscientes de que "estranho" ou "sui generis" são termos fluidos e plásticos como "bonito", "feio" e "massa". Aqui falarei da minha perspectiva - a única ao meu alcance - em que, não raras vezes, coisas bem banais parecem ridiculamente novas, e outras, normalmente hiper-inovadoras, têm um ar pretensiosamente "new shit" mas na verdade são os mais reciclados - e mal reciclados - clichês do world.

Ah, também repito e trepito que acho de bom tom considerar todos os gostos musicais válidos e legítimos, embora não igualmente desejáveis; e tb que todas as pessoas que procuram paranoicamente adequar seus gostos e desgostos estéticos aos ditames de um grupo qualquer que seja, em detrimento do seu próprio sentir e curtir um som, são pessoas idiotas. Allons-y:

Segue uma lista de três clipes bizarrrrrrrres! - a ordem de bizarrice pode variar.

#1: Mutual core


Eu não sou o primeiro a me jogar no falatório sobre esse vídeo e nem serei o último. Bjork já é conhecida por seus clipes super inovadores - e, tem-se que se dizer, às vezes, simplesmente estranhos mesmo (my opinion). Esse acima faz parte da minha lista pessoal de "clipes perfeitos". Porquê? Primeiro os temas: ciência, poesia, sexo: a mulher bota numa música palavras como "placas tectônicas", "erupção" e "núcleo" - essas duas últimas se referindo aos elementos geológicos mesmo. Pedras dançantes rodeando a cantora semi-enterrada na terra faz alguns mais acostumados a gaivotas sobrevoando um barquinho branco pensarem em maconha. A ideia aqui não  é fazer uma interpretação ou análise, mas a ideia de harmonia presente na renovação constante pela inconstância das derivas continentais, dos choques entre placas, das pedras que derretem e explodem num vulcão pra depois formarem mais terra: isso tudo é de uma poesia místico-científica linda. A primeira vez que se assiste esse vídeo, o queixo fica querendo voltar ao lugar ou o riso oscila entre desprezo e maravilhamento. Mas quando a coisa pega e vc deixa o espírito da canção entrar, os vulcões, as pedras que dão as mãos e as deusas da terra no final do clipe fazem todo o sentido. 

E claro que não tem como desprezar o apelo erótico do vídeo - se os produtores do filme não merecerem palmas por aludirem ao sexo por meio de pedras que se lambem, sinceramente, ninguém mais merece. Aí aqui entra o aspecto "gosto é igual a c*" da história: eu ouço essa música, vejo esse vídeo e o processo cola, faz sentido, ecoa aqui dentro. Talvez não em vc. Que seja. Quanto ao fato de o caráter geológico-pornográfico desse clipe fazê-lo mais que original, acho que se pode concordar com isso.


#2 I fink u freeky


Antes de qualquer coisa, falemos sobre Die Antwoord, a banda, ou a dupla responsável pela música. Ninja e Yolandi Vi$$er são personagens que se propõem - segundo eles mesmos -incorporarem uma coisa que eles chamam cultura Zef. Resumidamente o Zef é a subcultura dos descendentes de holandeses da África do Sul, os "brancos sujos", que num país pós-apartheid ocupa um lugar social só seu. Nas atuações e no discurso do Die Antwoord (que quer dizer a resposta, em afrikaaner), tem muito de teatralismo, mas que no fundo tem um quê de crítica social enrolada por uma camada grossa de gagaísmo (o desejo espontâneo e sincero de chamar a tenção por sua figura esquisitíssima). Drogas, sexo, racismo e desigualdade social é só o que tem nas letras e nos vídeos dessa dupla. O caldeirão de onde esse povo saiu, onde cultura extremamente diferentes entre si se cruzaram, produziu esse conjunto visual tão diferente de tudo, como se vê no clipe. Eles brincam com os preconceitos que o mundo tem a respeito da África do Sul, divertem-se com as mazelas e problemas locais (locais? Pobreza, injustiça social, drogas...); jogam na sua cara tudo aquilo que o mundo da música pop tenta em geral esconder, ou, no máximo maquiar: feiura, doença, e, mais uma vez, pobreza. O refrão da música acima é "I fink u freeky and I like u a lot" - num sotaque que eu acho delicioso - . É claro que tem aí um apelo afetivo forte: vc é esquito mas eu gosto muito de vc. Lembra aquela coisa Nirvana, Curt Cobain de ser: "I'm so happy cause I found my friends...": ei, entra aí, a gente é estranho e meio doido mas a gente se dá mó valor". E como nos demais clipes, um monte de "fokk" (o equivalente sul-africano de "fuck") se espalha no meio da música toda. E não é de se ignorar a influência estética do filme Distrito 9 no visual dos clipes da banda.

Quem viu "Freaks" sente uma conexão automática com a ideia de grotesco. Meu gosto pelo esquisito justifica minha simpatia por Die Antwoord e por essa música - mas certamente há mais do que isso: aquele "clique" estético: quando vc gosta de uma coisa, vc gosta e pronto. Não que minhas noções de nojento e sujo sejam morbidamente fluidas - até porque, mórbidos e sujos era como teriam que ser considerados os amantes de Zola, Augusto dos Anjos e Aluízio Azevedo... 

Conta muito também que o DJ Hi-Tech, que faz parte do grupo, é muito, muito bom. Mistura rap, hip hop e música eletrônica - e até batidas tribais locais - como poucos (como poucos dos poucos que eu conheço, hehe).

Enfim, sui generis aqui é a palavra.


#Venus as a boy


Na próxima lista vou tentar não me repetir, mas aí vai mais um da Bjork - e ela vai aparece em qualquer lista de clipes estranhos mesmo, that's inevitable.

Uma música bonitinha, legal - que a BJork canta com sua cara angelical dos vinte e poucos... enquanto frita um ovo.

Ok, mesmo que se queira, como é que fritar um ovo pode ser visto como algo poético? Olha, sinceramente, dá sim. Lembrando da sabedoria popular que diz que "a beleza está nos olhos de quem vê", então, todo mundo conhece a história do crítico de arte que diante do cabide de barro no qual pende um calango morto vê a alusão às angústias do sujeito contemporâneo, e coisas do tipo. Pois no pouco tempo que tentei ver "algo" no clipe (nem sempre é preciso ver "algo" em alguma coisa - ow meu povo, vamo relaxar!), vi o seguinte: alguém aí gosta de Clarice Lispector? Pois lembram do conto dela do ovo? Pois bem, a mulher faz um tratado existencial sobre o ovo, tão existencial que há quem já tenha feito tese de doutorado sobre o aspectos místico e zen-budistas do conto. Certo - ovo em inglês é egg, e egg também é óvulo. Vênus: amor, sexo, reprodução. Tem uma hora que aparece um lagarto no ombro da Bjork: em algumas culturas, o calango ou lagarto é um símbolo fálico... E olha que eu não bebi - e nem consultei críticas especializadas sobre o assunto - juro.

Nível de estranheza: alto. 

Ok, temos o que fazer. Mais uma lista fica pra próxima. Sugestões são benvindas.

domingo, 12 de maio de 2013

Mãe

Gosto da ideia de que todos os dias sejam dias das mães. Mas também acho nobre a ideia de escolher um dia para homenageá-las de uma forma especial - descontados todos os apelos comerciais cínicos.

Entre as várias homenagens possíveis, das mais simples e singelas - como a de comprar uma reles rosa no sinal de trânsito -, àquelas oriundas das entranhas que fazem chorar e rir ao mesmo tempo, a que está mais ao meu alcance é a seguinte.

A de crer, saber e cultivar que nós somos nossas mães - metade do que somos, pele, pelo, sangue, suor, tem os traços vivos do que são esses seres que nos carregaram magicamente dentro de si... Sinto e vivo o fato de ter a minha mãe aqui mesmo, agora, pensando e continuando em mim - e minha homenagem segue esse imperativo de continuar a ser quem sou porque sou ela ao mesmo tempo: e isso com e sem poesia, com e sem biologia. Assim como sou minha avó, e a minha bisavó, e a minha tataravó, e etc.

Mas também nós somos quem nós lembramos - e mãe é aquela que a gente lembra como mãe. Lembro da minha me explicando o azul do céu (e dane-se que ecoe Renato Russo aqui - eu LEMBRO, e essa lembrança é minha), o trovão e a chuva (uma vez sugeri que a chuva fosse o cuspe de Deus, e ela concordou, rindo, pra depois propor outra coisa...). Lembro dela dando o nó no meu sapato no meu primeiro dia de escola. Lembro dela dizendo como era boba essa coisa de dia das mães, mas lembro como ela sorria quando ganhava presente e abraço...

Enfim, enfim, enfim...

Uma mãe é um ser humano. Mas uma mãe é uma coisa infinita onde cada um de nós se formou do nada (meu cérebro nunca vai deixar de travar diante de uma magia dessas...), e como diante de toda coisa infinita, as homenagens são naturais e devidas.

Como a palavra pra se referir ao que eu sinto agora não existe, paro para agradecer, Mãe, por não apenas sermos quem eu e meus irmãos somos, mas simplesmente por sermos.

E lá vai um clichê - mas que está rasgando o peito nesse exato momento: mãe só tem uma.

terça-feira, 12 de março de 2013

Aulinha legal e divertida - com figurinhas! - para crianças e adultos especiais! (sobretudo para os que querem ir pro céu)

Oi crianças!

Hoje a lição é sobre homossexualidade e homofobia! Êeeee!!!

Olha que legal, prestem bem atenção nas figurinhas que o tio vai mostrar:

Homossexuais são pessoas, iguaizinhas a mim e a vc, ou ao Papa, ou à sua mãe ou ao seu vizinho fofoqueiro: elas comem, trabalham, riem, choram, vão pro parque, soltam pum e querem ser tratadas bem.

Homossexuais não nem antenas nem rabos, crianças. Eles podem ser assim ó:




 Eles podem ser médicos, cabeleireiros, motoristas de táxi, advogados, artistas, engenheiros, diretores de escola, padres, pastores...

Heterossexuais são assim - olha que legal:




Quem sabe qual é a diferença entre heterossexuais e homossexuais? Isso mesmo! Nenhuma!

 Antes de continuar com a nossa historinha, queria perguntar quem sabe que país é esse?

Olha, que sabidos! É o Brasil! Que país grandão né? Tanta gente mora aqui - gente preta, gente branca, gente mulata, índio, gente chata, gente legal... Sabe porquê? Porque o Brasil é uma DE-MO-CRA... CIAAAAA... E também é um país LAAAAAI-COOOO!!! Isso!

E esse país aqui, qual é?


Muito bem! É o Irã. O Irã não é uma democracia - é uma teocracia. O que é uma teocracia? Lá quem manda é Alá - Alá é como os muçulmanos chamam Deus. Os homens de lá matam e torturam quem não concorda com as coisas que os profetas disseram há mais de mil anos! Que coisa triste né, crianças?

Só pra repetir: o Irã é uma democracia?
- Nãããããão!!!
- O Brasil é uma teocracia?
- Nãããããão!
- Muito bem!

E o que é homofobia? Homofobia é quando uma pessoa tem raiva de um homossexual e faz tudo pra atrapalhar a vida dela. Tem gente que mata homossexuais só porque eles são homossexuais! É crianças!

Olha essa imagem, agora... O que é isso? Acertou! A Bíblia!
Uns homens muito velhos escreveram algumas partes há muito, muito tempo, uns 3000 anos atrás. Nesse tempo, os homens se vestiam com roupa de couro, nem tinham casa onde morar e matavam bezerrinhos e queimavam a carne deles pra calmar Deus, que naquela época era muito bravo:
Hoje ninguém faz mais isso no Brasil, mas tem gente que ainda quer matar homossexuais porque está escrito lá - mas porque será que tem gente grande que não pára de cortar a barba, como diz na Bíblia? Nem joga pedra na mamãe de vocês se ela sair sem o papai deixar? Pois é crianças, gente grande é esquisita né?

O mundo mudou muito e hoje a gente tem celular, computador, bebê de proveta, o carro... A ciência hoje é muito importante pra nossa vida e pra vida dos outros, né - a sociedade de hoje, de agora, não é a mesma do tempo de Noé, não é verdade?

Tem gente que diz que ser homossexual é uma doença. Mas vários cientistas disseram que nisso não é verdade. E todo mundo sabe que isso aqui, ó, é doença:


Isso, a gripe! E isso aqui também:
Que coisa feia! A pedofilia! O que foi que o tio disse se uma pessoa grande querer tocar em vocês de um jeito feio? Isso, chama o papai ou a mamãe pra eles chamarem a polícia!

Ah, e tem gente grande também que diz que ser gay é um crime, é uma coisa feia como usar drogas! Mas todo mundo sabe que isso aqui acontece...

...quando alguém usa drogas ou rouba alguém...
Mas vcs sabiam que o nosso país tem uma bíblia? Só que ela não foi escrita há mais de 3000 anos, mas  há mais de 30 anos. Como a gente chama essa bíblia? Isso, Constituição Federal! Ela muda de vez em quando - a constituição de 1988 não é a mesma do Império, por exemplo - as pessoas mudam e a bíblia do nosso país também tem que mudar. A bíblia de Deus só vale pra quem tá na igreja, tá crianças, mas a constituição vale pra TODO MUNDO. Na constituição, todo mundo é igual e deve ter acesso aos mesmos direitos e deveres:

Então se todo mundo é igual, esses casais aqui são todos iguais:

A Maria e o João:
O Felipe e o Paulo:
A Ana e a Cláudia:
E devem ter acesso aos mesmos direitos que o papai e a mamãe têm - não é verdade?

- Mas tio, eu não tenho papai nem mamãe...
- Mas tem a sua vovó e a titia, não tem?
- Tenho...
- Então, você também tem direitos, e sua vovó e sua tia, que cuidam de você, também!
- Mas isso é normal, tio?
- Claro que é!

Então crianças, se todo mundo respeitasse os outros, se todo mundo se importasse com a sua própria vida e se todo mundo seguisse as leis do país, o mundo não seria assim, ó?

Então, crianças, a lição é essa:

Todo mundo tem o direito de ser feliz contanto que não machuque o outro, tá bom?

Beijão!




Se o recado não estiver dado, aconselho para alguns fundamentalistas de plantão que se inspirem livremente neste filme.

Ou, para os mais temerosos com o Apocalipse, vejam isso.

No mais, abraço para todos e todas!